Boston Blue divide crítica e público em seu retorno ao universo dos Reagan

Spin-off de Blue Bloods emociona veteranos, mas enfrenta resistência nas redes sociais

por Ana Magal
Boston Blue, spin-off de Blue Bloods, mostra elenco principal em cena policial em Boston, destacando a nova dinâmica da família Reagan

Confesso logo de cara: sou suspeita para falar de qualquer coisa que tenha Donnie Wahlberg envolvido. Fui fã de carteirinha dos New Kids On The Block (NKOTB), aquela banda dos anos 80/90, que marcou minha juventude, e acompanho a carreira do Donnie desde então, até porque ele era o meu favorito da banda. Adicione Tom Selleck da série-mãe Blue Bloods à equação (sim, cresci assistindo Magnum P.I. – original – também – sou quase cinquentona e daí?), e vocês entendem por que era praticamente impossível eu desgostar dessa franquia.

Mas vamos ao que interessa: Boston Blue, o aguardado spin-off que estreou em outubro nos Estados Unidos, está provocando reações extremamente divididas. Enquanto a crítica especializada aplaude a produção e destaca a química do elenco, uma parte do público tem feito barulho nas redes sociais, questionando desde as escolhas de casting até a falta de “representatividade branca” (sim, estão incomodados com um elenco inter-racial) da série.





ATENÇÃO: SPOILERS A PARTIR DAQUI





A chegada dos Reagan em Boston

Sean e Danny Reagan em Boston / Reprodução CBS *

A série começa de forma impactante. Sean Reagan, filho mais velho de Danny (Donnie Wahlberg), agora interpretado por Mika Amonsen (substituindo Andrew Terraciano), está prestes a iniciar sua carreira como policial novato em Boston quando se envolve em um incêndio criminoso que o deixa gravemente ferido. É esse acidente que traz Danny para a cidade, onde ele conhece a família Silver, uma espécie de versão “bostoniana” (sim, inventei palavra – licença poética)  dos Reagan.

A matriarca da família, Mae Silver, vivida pela excelente Gloria Reuben (ER, Mr. Robot, The Blacklist), é Promotora Distrital (que no Brasil chamamos de Promotor de Justiça). Sua filha mais velha Lena, interpretada por Sonequa Martin-Green (The Walking Dead, Star Trek: Discovery), é detetive que se tornará parceira de Danny nas investigações. 

Completam o elenco Maggie Lawson (Psych 1, 2 e 3) como Sarah Silver, superintendente da polícia (que no Brasil pode ser chamado de Delegado-Geral ou Chefe de Polícia) de Boston, que é a filha do segundo marido de Mae; Marcus Scribner (Black-ish) como o jovem policial Jonah Silver, o irmão caçula, e o sempre carismático Ernie Hudson (Ghostbusters, Oz) como o Reverendo Edwin Peters, pai de Mae.

O que a crítica especializada está dizendo

Os veículos especializados têm sido generosos com Boston Blue. O site Mix de Séries deu nota 9/10, destacando a química imediata entre Wahlberg e Martin-Green e classificando a estreia como “sólida, nostálgica e promissora“. Aramide Tinubu, da Variety, elogiou a série como “uma continuação fascinante” que mantém a essência da original sem perder personalidade.

The Cave foi ainda mais entusiasta, afirmando que “a química entre Danny e Lena é instantânea, autêntica e natural“, e destacando que Martin-Green está “entre seus melhores trabalhos na TV desde The Walking Dead“. A publicação também ressaltou a importância de ter uma família negra no centro da história de forma orgânica e essencial para a trama.

Kristen Baldwin, da Entertainment, deu nota B+ e comentou que “às vezes, a melhor coisa que uma série pode fazer é entregar exatamente o que os espectadores querem“. Já o The Wrap observou que, apesar de um novo elenco e cenário, “Boston Blue mantém toda a essência da série original“.

A tempestade nas redes sociais

Mas nem tudo são flores. Os fóruns da internet, especialmente o Reddit, explodiram em debates acalorados. Uma parcela significativa dos espectadores acusa a série de ser excessivamente “woke” (termo usado pejorativamente por conservadores para criticar o que consideram “doutrinação de esquerda” ou excesso de diversidade).

As críticas mais comuns: 

  • família inter-racial (Mae teve um segundo casamento com um homem branco e “ousou” ter um filho mestiço com ele)
  • família inter-religiosa (os Silver mantêm jantares de Shabat às sextas-feiras, já que Mae se converteu ao judaísmo ao casar com o pai de Sarah, mas seu pai é um Reverendo da Igreja Batista)
  • mulheres negras em posições de poder (mesmo Sarah [branca e loira] sendo a Chefe de Polícia e dos próprios irmãos, se incomodaram que a mãe delas seja uma Procuradora negra)
  • e, pasmem!, até a falta de sotaque “bostoniano” autêntico

Alguns usuários chegaram a fazer cálculos demográficos da população negra de Boston para justificar seu desconforto com a representação da série.

Um usuário comentou que a série seria cancelada rapidamente porque “simplesmente não há um público de tamanho significativo que queira assistir“. Outro reclamou que Danny não é mais “o policial durão e adorável” de Blue Bloods e que os roteiristas transformaram a série em “agenda woke“.

Por outro lado, houve quem defendesse a produção. Um espectador conservador declarado afirmou não ver problema algum com a diversidade, dizendo conhecer pessoalmente várias famílias inter-raciais e inter-religiosas. Outro comentou: “A galera pira quando as séries reconhecem que pessoas de cor existem em todo lugar. Não é woke, é só o mundo real mesmo“.

Minha visão sobre a polêmica dos “fãs”

Cena do jantar de Shabat, sexta à noite, da família Silver, em Boston Blue (família inter-racial e inter-religiosa) / Reprodução CBS

Gente, por favor. É uma obra de ficção! A série é um spin-off que conta a história de uma família composta por policiais e promotores, que vivem para a justiça, são descendentes de imigrantes e têm sua fé em primeiro lugar. Ponto. A versão “bostoniana” é exatamente igual à nova-iorquina: uma família dedicada à justiça, formada por profissionais da lei que colocam a fé em primeiro plano. É a mesma trama, apenas em cidades diferentes, com personagens diferentes e, sim, com cor de pele diferente. Qual o problema?

Não consigo entender por que os estadunidenses se incomodam tanto quando colocam um ator ou atriz negra em posição de destaque. Por que só pessoas brancas podem ocupar essa “cadeira”? E por que só os homens brancos?

Na série-mãe, Erin Reagan (Bridget Moynahan) também era uma promotora durona que às vezes errava e às vezes acertava. Mas nunca foi criticada por ser branca. Agora caem de pau em cima da Mae, que faz praticamente o mesmo papel (até em maior posição de poder que Erin) com as mesmas escolhas difíceis, mas só porque é negra não pode ter esse poder?

Vi comentários absurdos de gente usando percentuais da população negra de Boston para justificar ódio gratuito antes mesmo de dar chance à série. Enquanto isso, a crítica especializada (composta majoritariamente por homens brancos, vale ressaltar) tem aplaudido de pé o spin-off, elogiando a delicadeza em manter aquele ar de nostalgia que víamos na série-mãe.

Sobre a qualidade da produção

 

Cena icônica dos jantares de domingo da família Reagan em Blue Bloods / Reprodução CBS

Particularmente, estou gostando muito de Boston Blue. Não digo que acho melhor que Blue Bloods, a original, porque lá está meu coração palpitando por Donnie e Tom Selleck juntinhos. Mesmo com Donnie nessa continuação da trama familiar, ficou um buraquinho no coração por não ver mais Frank Reagan (Tom Selleck), o vovô Henry (Len Cariou) e Eddie Janko (Vanessa Ray, que eu adorava seu personagem). Então sinto saudade, mas nem tanto, já que Erin e a detetive Baez (Marisa Ramirez) já apareceram para matar um pouco da saudade.

Aliás, uma das maiores surpresas do piloto foi descobrir que Danny e Baez agora são namorados (Chocada! Sempre senti química entre eles, principalmente depois que ele ficou viúvo). A relação que começou com uma simples saída para comer pizza no último episódio de Blue Bloods evoluiu para algo sério. Baez não permanece em Boston, mas já está confirmada em participações recorrentes durante a primeira temporada do spin-off.

A química entre Wahlberg e Martin-Green funciona muito bem. Ambos trazem experiência e carisma para seus papéis. Juntos criam uma dinâmica de parceria que promete ser o eixo central da nova série. O elenco de apoio também está afiado, especialmente Gloria Reuben, que vem comandando as cenas com presença marcante.

O que esperar do futuro da série?

O que será da trama, não sei. Existem muitas séries cujas seus spin-offs superam a série-mãe, como Law & Order SVU, que está há mais tempo no ar que Law & Order original (que até voltou a ser exibida). Mas outras, como os spin-offs de NCIS, vão se desmantelando pelo caminho enquanto a série-mãe continua firme e forte.

É tudo questão de gosto e também de dar uma chance real para a produção se desenvolver. Boston Blue tem potencial, tem um elenco forte, tem a estrutura narrativa que funcionou por 14 temporadas em Blue Bloods. O que falta é parte do público largar os preconceitos e assistir à série pelo que ela realmente é: um drama policial familiar bem construído.

A primeira temporada de Boston Blue terá 13 episódios, e o público gostando não, algo está dando certo, pois a série já foi renovada para segunda temporada com apenas 8 episódios tendo ido ao ar. Recomendo assistir se você era fã da série-mãe, Blue Bloods, e se aprecia séries policiais que têm um tom mais familiar que de ação. Se tudo o que falei se encaixa em seu perfil, então vale muito a pena conferir!

Minha nota para a série até o momento é: 9,8/10

 

À esquerda, Andrew Terraciano, que interpretou Sean Reagan em Blue Bloods. À direita, Mika Amonsen, o novo Sean em Boston Blue. / Reprodução CBS

*A mudança no ator de Sean Reagan em Boston Blue não aconteceu por acaso. Andrew Terraciano deu vida ao personagem por 14 temporadas em Blue Bloods, ao lado do irmão Tony Terraciano (que interpretava Jack Reagan), que deixou a série para cursar medicina e hoje atua como médico-pesquisador de câncer. Assim como o irmão, Andrew também estava focado na faculdade, o que pesou na transição para o spin-off.

Além disso, Boston Blue passou a ser gravada em Toronto, no Canadá, o que tornaria a logística ainda mais complicada para o ator conciliar estudos e gravações. Segundo os produtores, a reformulação também simboliza um novo capítulo na vida de Sean e de Danny Reagan, justificando a escolha de um novo intérprete para acompanhar essa fase mais adulta e desafiadora do personagem. Agora que vive o novo Sean é Mika Amonsen.

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