A Fórmula 1 atravessa os últimos dias de 2025 sob tensão máxima nos departamentos de engenharia, preparando-se para a transformação técnica mais profunda desde a introdução da era híbrida em 2014. Com os primeiros testes de pré-temporada agendados para janeiro de 2026, as escuderias correm para finalizar os projetos que estrearão o novo regulamento de Unidades de Potência (UP). A mudança central é a eliminação do complexo MGU-H (recuperação de energia térmica) e o aumento drástico da eletrificação: o motor elétrico passará a entregar cerca de 350 kW (quase 475 cv), igualando a força do motor a combustão interna V6, que agora utilizará combustível 100% sustentável para zerar emissões líquidas.
Para acomodar essa nova arquitetura de propulsão e as baterias maiores, os carros passarão por uma reconfiguração conceitual de chassi. A largura total será reduzida de 2000mm para 1900mm, e o entre-eixos encurtado para promover maior agilidade em circuitos de rua. No entanto, o grande desafio técnico reside na “aerodinâmica ativa”. Diferente do DRS atual, o sistema de 2026 ajustará simultaneamente as asas dianteira e traseira em dois modos: um de baixa resistência para as retas (modo “X”) e um de alta pressão para as curvas (modo “Z”), essencial para manter tempos de volta competitivos com menos potência a combustão.
A gestão de energia durante a corrida deixará de ser um detalhe periférico para se tornar o centro da estratégia de pilotagem. O novo regulamento introduz o conceito de Manual Override, substituindo as zonas fixas de DRS por uma lógica de potência tática. O piloto que estiver perseguindo um rival poderá acionar uma descarga elétrica extra em altas velocidades para atacar, enquanto o carro à frente terá sua potência limitada gradualmente no final das retas. Essa dinâmica promete forçar os pilotos a tomarem decisões cerebrais sobre onde e quando gastar sua reserva de energia, alterando a natureza das disputas de posição.
O xadrez das montadoras e o fator Alpine
O grid de 2026 desenha um novo mapa de poder industrial na categoria máxima. A Audi oficializa sua entrada como equipe de fábrica plena ao assumir o controle total da operação da Sauber, tornando-se a única nova construtora a desenvolver chassi e motor simultaneamente desde a Mercedes em 2010. A gigante alemã investiu pesado nas instalações de Neuburg para criar sua unidade de potência do zero, um movimento de alto risco que coloca a marca sob escrutínio imediato. Paralelamente, a Ford retorna à F1 como parceira técnica da Red Bull Powertrains, focando em baterias, e a Honda migra sua expertise vitoriosa para a Aston Martin, criando um novo polo de força exclusivo.
Na contramão das novas entradas, a indústria francesa protagoniza um recuo histórico. A Alpine confirmou o encerramento do programa de motores de Viry-Châtillon, sede tradicional da Renault Sport. A partir da temporada de 2026, a equipe competirá utilizando o “pacote completo” (motor, câmbio e suspensão traseira) fornecido pela Mercedes. A decisão, motivada por custos e falta de performance, marca o fim de quase 50 anos da Renault como construtora de motores na F1, transformando a Alpine em uma equipe cliente focada apenas na aerodinâmica, uma estratégia pragmática para tentar recuperar competitividade no pelotão intermediário.
As veteranas Ferrari e Mercedes mantêm a estabilidade de seus projetos integrados, mas enfrentam o desafio de revalidar seus dados de túnel de vento com as novas regras de fluxo de ar ativo. A Ferrari aposta em um conceito de refrigeração inovador para as baterias, vitais para manter a performance de 350 kW constante durante uma volta de classificação. A batalha de 2026 não será apenas sobre quem tem mais cavalos de potência bruta, mas sobre quem consegue regenerar energia de forma mais eficiente nas frenagens, já que a capacidade de recuperação por volta foi dobrada em relação aos carros de 2025.
O Brasil no grid: Gabriel Bortoleto e a Audi
A temporada inaugura um capítulo renovado para o automobilismo brasileiro com a consolidação de Gabriel Bortoleto como titular da Audi. O piloto, preparado pela academia da Sauber, assume um dos assentos mais cobiçados e pressionados: o de uma montadora estreante com orçamento robusto e visão de longo prazo. Diferente de pilotos brasileiros recentes que entraram em equipes menores ou como reservas, Bortoleto chega com status de peça-chave no desenvolvimento, tendo a missão de ajudar a calibrar o primeiro carro de F1 da história da marca das quatro argolas.
A presença de um brasileiro em uma equipe de fábrica alemã traz um peso comercial imediato para a categoria no país. A expectativa é que a audiência e o engajamento digital, que se mantiveram estáveis, cresçam exponencialmente com a possibilidade real de ver um piloto nacional disputando pontos regularmente. Para o mercado do Rio de Janeiro e do Brasil, isso reaquece o interesse de grandes patrocinadores locais que haviam se afastado da F1 por falta de um representante competitivo no grid. A Audi deve utilizar a imagem de Bortoleto para alavancar suas vendas de veículos eletrificados na América do Sul.
Tecnicamente, o desafio para Bortoleto será de adaptação rápida aos sistemas complexos de brake-by-wire (freios eletrônicos). Com a necessidade de regenerar muito mais energia no eixo traseiro, a sensibilidade do pedal de freio será artificial e variável, exigindo do piloto uma precisão cirúrgica para evitar travamentos de roda na entrada das curvas. A capacidade do brasileiro de fornecer feedback técnico preciso aos engenheiros alemães será determinante para a evolução da Audi em seu ano de estreia.
Raio-X
Principais mudanças técnicas e calendário
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Motorização: Fim do MGU-H; motor elétrico sobe para 350 kW (50% da potência total).
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Combustível: 100% sustentável (bio-combustível ou sintético de carbono neutro).
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Aerodinâmica: Sistema ativo nas asas dianteira e traseira (Modos X e Z).
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Dimensões: Carros 20cm mais curtos e 10cm mais estreitos que os atuais.
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Montadoras 2026: Ferrari, Mercedes, Audi (estreia), Red Bull Ford, Aston Martin Honda. Alpine usa motor Mercedes.
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Data Importante: Lançamento do carro da Audi previsto para 20 de janeiro de 2026.
