Adaptação do premiado livro de Stênio Gardel, “A Palavra que Resta”, da Cia Atores de Laura, estreia no Teatro da UFF para curta temporada

Montagem que celebra os 32 anos da companhia está indicada ao 19º Prêmio APTR nas categorias Direção (Daniel Herz) e Atriz em Papel Coadjuvante (Valéria Barcellos)

por Redação
A Palavra que Resta

As dores e os dilemas de um homem que precisou ocultar a própria sexualidade por décadas, para sobreviver em meio a uma sociedade provinciana e heteronormativa,  são levadas para o palco em “A Palavra que Resta”, versão para o teatro do premiado livro do escritor cearense Stênio Gardel — vencedor do National Book Awards na categoria literatura traduzida —, que estreia no dia 4 de abril em Niterói, no Teatro da UFF, após duas bem-sucedidas temporadas no Teatro Correios Léa Garcia e Teatro Laura Alvim, no Rio.  Sob a direção de Daniel Herz, a peça está indicada ao 19º Prêmio APTR nas categorias Direção (Daniel Herz) e Atriz em Papel Coadjuvante (Valéria Barcellos).

O potente romance de estreia de Gardel percorre os conflitos familiares do protagonista, Raimundo Gaudêncio de Freitas, e as relações que ele estabeleceu depois de fugir de casa e cair na estrada, bem como as catarses e ressignificações impostas pelo destino. A encenação de Herz, que também assina a adaptação, inova na condução das vozes dos personagens: os seis atores em cena se revezam em todos os papéis. O espetáculo da Cia Atores de Laura, que celebra 32 anos de existência, traz no elenco  Ana Paula Secco, Charles Fricks, Leandro Castilho, Paulo Hamilton e Verônica Reis — e a atriz convidada Valéria Barcellos.

“Somos todos Raimundo. Tem uma roupa base do Raimundo, que é um macacão — entre os figurinos lindos que o Wanderley (Gomes) criou. Temos aqui uma pluralidade. Quando trabalhei na adaptação já fiz as divisões todas. Existe uma unidade em todos que o interpretam: a angústia. Raimundo experimenta a vida para poder adquirir coragem para vivê-la. Ele tem dificuldade de reconhecer o seu desejo, esconde a homossexualidade, tenta gostar de mulher, finge, trabalha com caminhoneiros, procura se proteger em meio a uma sociedade heteronormativa”, conta Daniel Herz. “A forma com a qual Stênio conta essa história e a descreve com suas palavras e metáforas é tocante, profunda. Há uma beleza na tragicidade”, observa o ator Paulo Hamilton

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Nascido no sertão nordestino, Raimundo trabalha desde cedo na roça e não teve a oportunidade de ir à escola. Durante a fase de descoberta do sexo, na juventude, apaixona-se pelo melhor amigo, Cícero. Após serem flagrados juntos, são demonizados e separados pelas duas famílias. “Raimundo é chicoteado pelo pai e a mãe faz ainda pior: o coloca para fora de casa, contrariando o senso comum de que as mães são mais acolhedoras. Como somos uma companhia, e teatro é brincar de ser outro, o nosso rodízio exige uma atividade cerebral do público, até porque a história vai e volta no tempo”, continua Herz. “Desta forma, o revezamento ganha também uma agilidade que a trama precisa ter em cena”, acrescenta a atriz Verônica Reis.

Para o ator Charles Fricks, essa dinâmica cênica proposta pelo diretor humaniza a todos. “Podemos ser tanto o que oprime como o que é oprimido. Podemos ser a mão que afaga como também a que chicoteia, em nome de Deus. É importante contar histórias como essa: as pessoas precisam saber que não estão sozinhas no mundo”, avalia Fricks.

Nesse caminho de pedras, Raimundo conhece o acolhimento justamente ao desenvolver uma amizade com uma mulher trans, vivida por Valéria Barcellos, e também por Verônica Reis e Ana Paula Secco. “Ele é transfóbico inicialmente, mas se permite se aproximar dessa pessoa. Tenho muito em comum com a Susany: já fui agredida assim como ela – inclusive. Mas nunca lancei mão da prostituição”, conta Valéria. “Acredito que a mensagem que fica é: não tenha medo de se aproximar, permita-se olhar para o outro, mas não por cima do muro. Convide-o para tomar um café. Saia dessa superficialidade”, propõe.

Ana Paula Secco festeja o reencontro da Cia Atores de Laura, que há 6 anos não se encontrava completamente em cena, nesta montagem cuja direção de produção é uma parceria da CultConsult Produções com a Escudero Produções. “A experiência de estarmos contando essa história está sendo muito boa. A adaptação do Daniel Herz ficou muito fiel ao livro. Sinto que a peça é, no fundo, uma história de família e, por isso, nos faz passearmos pelas nossas próprias origens”, diz.

Depois que são defenestrados e separados na trama, Cícero desaparece, deixando apenas uma carta a Raimundo, que era analfabeto. Uma vez expulso de casa pela mãe, ele passa mais de 50 anos sem saber ler ou escrever. Aos 71 anos, resolve ser alfabetizado para poder saber o que, enfim, o seu amado do passado havia lhe escrito.

“Infelizmente, ainda vivemos em meio a uma sociedade homofóbica e racista. O que mais me encantou nesta obra do Stênio é que ela fala de pessoas à margem da sociedade, da ideia de que a diferença produz o medo que, por sua vez, acaba levando ao ódio. Fiquei muito arrebatado ao ler o livro. Se o espetáculo mostrar quanta dor desnecessária a gente produz na sociedade, se a gente tivesse mais empatia para lidar com o outro, já valeu”, torce o diretor Daniel Herz.

Cia Atores de Laura

Fundada em 1992, sob a direção de Daniel Herz, a Cia Atores de Laura dedica-se desde o início ao trabalho coletivo, com o objetivo de pensar e realizar o ator como força principal do jogo cênico, em torno do qual são construídas, paralela e posteriormente, a direção, a cenografia, a vestimenta e a iluminação. Em mais de 30 anos de trabalho, a Cia já se apresentou em várias cidades do Brasil e no exterior (festivais na França e na Argentina). Tem no seu repertório 21 montagens teatrais e 23 premiações. Dentre seus últimos espetáculos, destacam-se as montagens de “Absurdo – Pandemia” (texto: Cia Atores de Laura / direção: Daniel Herz); “Fronteiras Invisíveis” (texto: Cia Atores de Laura / direção: Daniel Herz e Luis Felipe Sá); “O Pena Carioca” (da obra de Martins Pena / direção e concepção: Daniel Herz), “Absurdo” (criação coletiva: Atores de Laura / direção: Daniel Herz), “O Filho Eterno” (do romance de Cristovão Tezza / adaptação: Bruno Lara Resende / direção: Daniel Herz), “Adultério” (criação coletiva: Atores de Laura / direção: Daniel Herz), “O Enxoval” (criação coletiva: Atores de Laura / direção: Luiz André Alvim), “As Artimanhas de Scapino” (de Molière / tradução: Carlos Drumond de Andrade / direção: Daniel Herz), “Beatriz” (do romance de Cristovão Tezza / adaptação: Bruno Lara Resende / direção: Daniel Herz).

Ficha técnica 

  • Texto original: Stênio Gardel
  • Adaptação e direção: Daniel Herz
  • Com: Ana Paula Secco, Charles Fricks, Leandro Castilho, Paulo Hamilton, Valéria Barcellos e Verônica Reis
  • Cenário e figurinos: Wanderley Gomes
  • Iluminação: Aurélio de Simoni
  • Trilha sonora: Leandro Castilho
  • Programação visual: Luciano Cian
  • Direção de Produção: CultConsult Produções e Escudero Produções
  • Produção executiva: Clarah Borges
  • Realização: Cia Atores de Laura
  • Assessoria de imprensa: Dobbs Scarpa

Serviço 

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