Um detalhado registro enviado à Securities and Exchange Commission (SEC) na última quarta-feira expôs a volatilidade e a tensão nos bastidores da venda da Warner Bros. Discovery. Os documentos revelam que a gigante de mídia rejeitou seis propostas consecutivas da Paramount antes de selar o acordo de US$ 82,7 bilhões com a Netflix, em um processo marcado por ofertas de bônus polêmicos e ultimatos de última hora.
De acordo com os registros de 17 de dezembro, a Paramount, liderada por David Ellison, tentou repetidamente adquirir os ativos da Warner entre setembro e dezembro de 2025. Durante as conversas iniciais, Ellison teria sugerido um pacote de compensação a David Zaslav, CEO da Warner Bros., avaliado em “centenas de milhões de dólares”. Zaslav, contudo, informou ao conselho que considerou “inapropriado” discutir tais arranjos financeiros naquele estágio das negociações.
Opacidade financeira e fundos soberanos sob suspeita
O principal entrave para a proposta da Paramount não foi apenas o valor, mas a origem e a solidez do financiamento. O conselho da Warner Bros. Discovery manifestou ceticismo severo quanto à dependência de US$ 24 bilhões provenientes de fundos soberanos do Oriente Médio, incluindo o Fundo de Investimento Público da Arábia Saudita, a L’imad Holding Company (Abu Dhabi) e a Autoridade de Investimento do Catar.
Além disso, os conselheiros questionaram a viabilidade do Lawrence J. Ellison Revocable Trust, que aportaria US$ 40,7 bilhões. O documento da SEC descreve o fundo como uma “entidade opaca”, cujos termos, beneficiários e ativos não são públicos, o que gerou insegurança sobre o compromisso real do capital oferecido.
O erro estratégico da Paramount e a carta de acusação
A relação entre as empresas deteriorou-se em 3 de dezembro, quando advogados da Paramount enviaram uma carta agressiva acusando a Warner Bros. de favorecer deliberadamente a Netflix. O movimento foi classificado como um erro tático: os próprios consultores financeiros e jurídicos da Paramount teriam admitido aos representantes da Warner, nos dias seguintes, que a carta foi “inútil” e um equívoco diplomático.
A concorrência: as ofertas de Comcast e Starz
Os documentos da SEC também trouxeram à luz o interesse de outros grandes nomes do setor:
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Comcast: Apresentou uma proposta de US$ 35,43 por ação, composta por US$ 5,25 em dinheiro e uma participação de 49% em uma nova entidade que fundiria a NBCUniversal com as divisões de estúdio e streaming da Warner.
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Starz (identificada como “Empresa C”): Propôs US$ 25 bilhões em dinheiro pela rede de TV a cabo e por 20% dos negócios de cinema e streaming. A oferta foi considerada “inviável” pelo conselho.
O ultimato de Ted Sarandos e o desfecho com a Netflix
A decisão final foi precipitada por uma manobra de força da Netflix. Em 4 de dezembro, horas antes da reunião decisiva do conselho da Warner, o co-CEO da Netflix, Ted Sarandos, enviou um ultimato a Zaslav: a proposta deveria ser assinada imediatamente, ou seria considerada nula antes da abertura do mercado no dia seguinte.
Pressionado pelo prazo e pela solidez da oferta, o conselho aprovou a venda na mesma noite, anunciando o mercado global em 5 de dezembro.
O “pacote de saída” de David Zaslav
Embora o acordo com a Netflix tenha sido o escolhido, os documentos revelam o que Zaslav poderia lucrar caso a oferta pública hostil da Paramount (de US$ 30 por ação) fosse bem-sucedida. O executivo estaria elegível para receber uma remuneração total de US$ 567 milhões, somando US$ 30 milhões em indenização em dinheiro e US$ 537 milhões em participações acionárias.