“Um encontro secreto está marcado entre as gerações passadas e a nossa”. A frase de Walter Benjamin é uma provocação para o público assistir a montagem de “Olga“, com direção de Luiz Fernando Lobo, que a Companhia Ensaio Aberto estreia dia 16 de agosto, sábado, no Teatro Vianinha, no Armazém da Utopia, na Região Portuária do Rio de Janeiro. As sessões acontecem às sextas, sábados, domingos e segundas, às 20h, até 29 de setembro.
A dramaturgia de Luiz Fernando Lobo foi feita a partir de longa pesquisa em arquivos brasileiros, europeus e americanos, em documentos primários. A Ensaio Aberto reabre arquivos, escava e traz à tona documentos que confrontam a história oficial. “Os documentos, mesmo os aparentemente mais claros, não falam senão quando sabemos interrogá-los”, diz o historiador Marc Bloch. E complementa: “Nunca, em nenhuma ciência, a observação passiva gerou algo de fecundo. Olga é um exemplar da tradição do Teatro Documentário, que tem em Piscator e Peter Weiss seus precursores. A encenação realiza uma nova abertura da história ao apontar as contradições e camuflagens produzidas pela história oficial”.
Nascida em Munique, em 1908, Olga Benário Prestes militou no movimento comunista desde a adolescência, enfrentando desde cedo a repressão policial. Foi treinada como agente do Comintern (Internacional Comunista) em Moscou e, em missão política, veio ao Brasil nos anos 1930 com Luiz Carlos Prestes. Foi presa em 1936 e deportada com 7 meses de gravidez para a Alemanha de Hitler, por ordem de Getúlio Vargas, colaborador da polícia nazista. Foi assassinada, em 1942, numa câmara de gás do campo de concentração de Bernburg. Sua filha, Anita Leocádia Prestes, sobreviveu graças a uma mobilização internacional, liderada por sua sogra Maria Leocádia Prestes. Como diz a própria Anita Prestes: “Sou filha da solidariedade internacional”.
Olga, assim como outros militantes, foi expulsa do país sem nenhum processo legal, violando não apenas os princípios do direito internacional, mas também os limites da barbárie. “Contamos para lembrar, para rememorar, para reparar, e, sobretudo, para repensar caminhos. Durante muitos anos, repetiu-se à exaustão mentiras. A história oficial, no Brasil, negou aos revolucionários de 1935 qualquer papel relevante. O que era um levante armado, virou Intentona”, explica o diretor, Luiz Fernando Lobo.
Os torturadores de 1935, 1936 e 1937 nunca foram punidos. Vencedores e vencidos tiveram o mesmo tratamento da história: o esquecimento ou a falsificação da realidade. Mas há uma diferença. É o esquecimento que permite a impunidade e consequentemente a perpetuação de crimes abomináveis. Para os torturados, para os presos, para os deportados, para os mortos, só a rememoração dessas derrotas pode reabilitá-los diante da história, e evitar, como diz Benjamin, “a segunda morte das vítimas do passado”, diz Lobo.
Comunista, judia, internacionalista e antifascista, Olga começou a militar com 16 anos. Era uma mulher de grande coragem e inteligência. Aviadora, paraquedista, exímia atiradora, exímia nadadora, amazona. Com 18 anos, entra na clandestinidade por realizar uma ação armada para libertar seu companheiro e mentor político, Otto Braun, de um presídio de segurança máxima. Vem para o Brasil como segurança de Luiz Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperança. E em 05 de março de 1936, quando a polícia “estoura” o esconderijo dos dois, já casados, no Méier, ela se coloca na frente do marido e o salva de ser morto pela polícia de Getúlio Vargas. Ela foi assassinada, mas sua luta continua até os dias de hoje.
“O levante de 1935 foi o primeiro levante armado contra os fascistas no mundo. Quase 100 anos depois, assistimos a extrema direita ganhar força em todo mundo. E esse é o papel do teatro documentário: estar à altura da realidade”, defende Tuca Moraes.
O elenco é composto por 13 atores do núcleo artístico da Ensaio Aberto, e Tuca Moraes interpreta Olga. J.C. Serroni (cenário); Beth Filipecki e Renaldo Machado (figurino); Cesar de Ramires (iluminação); Felipe Radicetti (direção musical e trilha original) e Aninha Barros (produção executiva) encabeçam a equipe do espetáculo.
“Olga” inicia as comemorações de 15 anos da ocupação do Armazém da Utopia (que acontece no segundo semestre de 2025) com a triste curiosidade de que foi deste porto do Rio de Janeiro que Olga Benario Prestes foi deportada no navio La Coruña para a Alemanha.
Companhia Ensaio Aberto
A Companhia Ensaio Aberto nasceu no ano de 1992 com a proposta de retomar o teatro épico no Brasil e fazer dos palcos uma arena de discussão da realidade, resgatando sua vocação crítica e política. Desde que foi fundada pelo diretor Luiz Fernando Lobo e pela atriz Tuca Moraes, a Ensaio Aberto explora a ideia do ensaio como experimento e busca retomar a função social do teatro, transformando a relação palco-plateia.
Ficha Técnica
- Direção e dramaturgia: Luiz Fernando Lobo
- Direção de Produção: Tuca Moraes
- Cenografia: J.C.Serroni
- Figurinos: Beth Filipecki e Renaldo Machado
- Iluminação: Cesar de Ramires
- Direção musical e trilha original: Felipe Radicetti
- Produção Executiva: Aninha Barros
Elenco
- Tuca Moraes como Olga
- Ana Clara Assunção
- Bibi Dullens
- Eduardo Cardoso
- Gilberto Miranda
- Grégori Eckert
- Leonardo Hinckel
- Luiz Fernando Lobo
- Mariana Pompeu
- Mateus Pitanga
- Michael Di’Martino
- Rossana Rússia
- Thaise Oliveira
- Uriel Dames
Serviço
De 16 de agosto a 29 de setembro
Local: Teatro Vianinha | Armazém da Utopia | Região Portuária | Rio de Janeiro
Horário: sextas, sábados, domingos e segundas, às 20h
Abertura da casa 1h antes do início do espetáculo, com cota de ingressos liberados no dia
Classificação indicativa: 14 anos
Duração: 70 minutos
Inteira: R$ 60,00 | Meia: R$ 30,00
www.sympla.com.br/
Dia 18/8 – apresentação com intérprete de libras
Para agendamento de grupos (escolas, projetos sociais, associações, etc.) entre em contato por meio do WhatsApp (21) 98909-2400
@CompanhiaEnsaioAberto
Lotação: 120 espectadores
Cinco sessões de Olga são gratuitas, contempladas pelo Festival Em Boa Companhia – Termo de Fomento/FUNARTE TransfereGov nº 934254/2022, celebrado entre o Instituto Ensaio Aberto e o Ministério da Cultura e a Fundação Nacional das Artes.