“Consigo inventar tudo” de Julia Barandier

Notório pintor e retratista francês do século 19, Claude Barandier fez carreira no Brasil dentro do contexto da pintura acadêmica da Missão Francesa, que seguia os padrões neoclássicos e valorizava a estética greco-romana. Nascido na pequena vila de Chambéry em 1807, emigrou para o Brasil em 1838. Morou no Rio de Janeiro e Campinas, onde viveu até o fim da vida. Barandier circulou entre a elite da corte portuguesa, retratou nobres, artistas e até mesmo o imperador Dom Pedro II.

Esses fatos de sua biografia são todos reais, mas servem somente como ponto de partida do segundo romance da escritora carioca Julia Barandier, “Consigo inventar tudo” (Diadorim). Descendente do personagem, a autora escapa das convenções da autoficção familiar e narra uma história enigmática e inventada a partir de retalhos sobre seu mais antigo antepassado a viver no Brasil.

“A sofisticação da estratégia narrativa do livro mostra que Julia Barandier é uma escritora que procura enfrentar novos desafios — e deles se sai muito bem. ‘Consigo inventar tudo’ é um romance denso e enigmático, que mais do que confirma a promessa de Bakken” – Paulo Henriques Britto

A figura do renomado pintor sempre permeou as conversas familiares da autora, mas não eram os quadros expostos nos museus e galerias que mais intrigavam a escritora. Formada e mestranda em Letras, a pesquisa em arquivos públicos é um de seus grandes temas de interesse – mas o que a intriga, de fato, é muito mais as lacunas que as pesquisas escondem do que aquilo que os documentos preservados revelam.

É dessa brecha que surge sua segunda obra de ficção, um romance denso, sombrio, silencioso, que flerta com o horror e remete à literatura gótica de nomes como Mary Shelley, Emily Brönte, Oscar Wilde e Charles Dickens. Julia preenche o vazio documental com imaginação, recria personagens com pinceladas de loucura e joga com os limites entre a realidade e a ficção.

“O processo desse livro, muito diferente do primeiro, foi árduo. Passei muitos dias imersa na atmosfera sombria e lidando com personagens duros, melancólicos e solitários. Acho que eu mesma entrei no ritmo da obsessão da minha protagonista. E, no final da escrita, me sentia um pouco como ela: duvidando das minhas fontes, dos arquivos, sentindo que estava cutucando um pouco excessivamente os fantasmas do meu passado.”, avalia Julia.

Julia Barandier

Definida pelo poeta, tradutor e imortal Paulo Henriques Britto, que assina a orelha do romance, como uma ficção sofisticada, escrita em várias camadas, a obra gira em torno de dois eixos narrativos que se entrelaçam na parte final do livro. De um lado, o leitor acompanha a relação conflituosa e ambígua entre Claude Barandier e sua filha única, Louise. Órfã de mãe e reaprendendo a viver em um país distante do seu, Louise nutre pelo pai, ao mesmo tempo, admiração e rancor. Amor e ressentimento se fundem numa relação marcada pelo silêncio taciturno.

Em paralelo, o romance mergulha na história de uma pesquisadora dos dias atuais que prepara um trabalho acadêmico sobre a vida e obra de Claude, enquanto é pressionada por sua mãe para assumir as rédeas da própria vida. É dessa voz narrativa contemporânea que emergem outros questionamentos, como a insegurança individual e os riscos da pesquisa acadêmica. É ela quem aponta alguns dilemas fundamentais para a autora, ao indagar a crueza do universo acadêmico e a própria produção da verdade nas ciências humanas.

Entre o devaneio inventivo e a investigação histórica, Julia percorre milênios, partindo da mitologia grega, em que evoca figuras míticas como Ajax, Hades e Odisseu, e as múltiplas simbologias da arte sacra, mas que, sobretudo, coloca no palco da tragédia humana as tensões que marcam as relações parentais, universais em qualquer tempo da história. E as mesmas que assombram o passado e o presente.

A autora:

Julia Barandier é carioca, formada em Letras com diploma de mérito pela PUC-Rio e mestranda em Estudos da Linguagem pela mesma Universidade. Em 2022, lançou o romance “Bakken”, pela Editora 7Letras e, em 2023, a plaquete “Recorrer às ossadas”, pela Janela + Mapa Lab. “Consigo inventar tudo” é o seu segundo romance.

Eventos de lançamento:

Rio de Janeiro

19/08 I terça-feira I 19h | Livraria Argumento (Rua Dias Ferreira, 417 – Leblon)
Conversa com o editor João Nunes Jr., escritor, roteirista e sócio da Diadorim Editora e sessão de autógrafos

São Paulo

a ser definido

Ficha Técnica:

  • Título: Consigo inventar tudo
  • Autor: Julia Barandier
  • Gênero: Romance
  • Editora: Diadorim
  • Impresso: R$ 75,00
  • Número de páginas: 94
  • Data de lançamento: agosto de 2025

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