Exposição em Teresópolis explora o conceito de identidade através da obra de cinco artistas do Rio de Janeiro

Outsiders - Ana Hortides

Como nossas memórias e vivências moldam quem somos? A exposição “Grafismos de Pequenas Singularidades” convida o público a explorar essa pergunta através da arte. A partir do dia 14 de março, a mostra ocupa o Sesc Teresópolis apresentando o trabalho de cinco artistas contemporâneos do Rio de Janeiro: Ana Hortides, Carla Santana, Gilson Plano, Mayara e Ray Fahr. Sob a curadoria de Ludimilla Fonseca e Ray Fahr, a exposição propõe uma imersão sensorial e afetiva no conceito de identidade, explorando suas múltiplas camadas simbólicas e culturais através de temas como corpo, paisagem, ancestralidade, casa e memória.

Grafismos de Pequenas Singularidades propõe uma reflexão subjetiva sobre a identidade, abordando como as origens, a vivência e a história de cada artista reverberam indiretamente em sua arte. “O conceito da exposição parte da ideia de identidade enquanto processo fluido e múltiplo. Não estamos falando de uma identidade rígida, mas de construções que se dão no corpo, no espaço e no tempo, atravessadas pela história, pela família e pelas experiências pessoais”, explica Ludimilla. “As obras selecionadas têm em comum esse viés da transformação: algo que vem de uma história, mas que o trabalho já chegou num lugar, já transcendeu”, completa Ray.

Um dos principais pontos de partida para a concepção foi a observação dos materiais utilizados pelos artistas – cimento, ferro, argila, tecido e couro –, elementos do cotidiano e da memória afetiva, ressignificados em propostas visuais distintas. “Fomos criando uma relação historiográfica a partir do uso desses materiais, criando uma interseção entre esses artistas que, apesar de muito distintos, possuem essa linha tênue em comum”, explica Ray.

Ana Hortides revisita o ambiente doméstico e urbano ao utilizar cimento e cacos de azulejo, remetendo às casas do subúrbio e às memórias da avó. Suas obras evocam um pertencimento enraizado na arquitetura vernacular e na simplicidade do cotidiano, transformando o trivial em potência poética. Já Mayara explora o cimento de uma perspectiva distinta: suas esculturas utilizam o material como base para tecidos e couros que remetem à história de sua família no Salgueiro, comunidade onde o ofício da costura e do estofamento faz parte da ancestralidade. “Existe uma conexão direta entre o fazer da Mayara e a construção de identidade a partir da memória familiar e comunitária. Cada peça carrega marcas desse passado que continua pulsando no presente”, comenta Ludimilla.

O trabalho de Gilson Plano dialoga com sua vivência na construção civil – ofício de seu pai – ao manipular ferro e concreto de forma a subverter a rigidez desses materiais. Suas esculturas, apesar da robustez dos elementos utilizados, sugerem movimento e leveza, provocando uma reflexão sobre tempo, ancestralidade e as tecnologias que atravessam gerações. “O Gilson transforma estruturas brutas em objetos poéticos que, ao mesmo tempo, remetem à solidez do concreto e à efemeridade do movimento”, observa a curadora. Por sua vez, Carla Santana recorre à argila para criar pinturas: em vez de esculpir, ela a utiliza como pigmento. O resultado são obras que abordam a ancestralidade e a relação do corpo com a terra, apresentando uma materialidade que remete às raízes e à origem. “As pinturas da Carla são como peles que guardam as marcas do fazer. Seu trabalho é minucioso, exige tempo e cuidado”, explica Ludimilla.

Bailarino por formação, Ray Fahr apresenta telas que traduzem o movimento do seu corpo durante uma coreografia, criando composições que flutuam no espaço e registram gestos e deslocamentos. “Minhas obras foram criadas a partir do que chamamos de notação coreográfica. A espessura das linhas indica se o movimento é leve ou pesado. O contorno, se eles são com arestas, movimentos com fluxo fragmentado ou contínuo. O tamanho das formas também indica duração de movimento, que é o tempo”, explica Ray. “Para mim, o Ray traduz o movimento não apenas de forma visual, mas também afetiva. Suas obras convidam o público a se mover junto, a perceber o corpo no espaço”, reforça Ludimilla.

O espaço expositivo foi pensado para desafiar a percepção do visitante. Em vez de uma sequência tradicional de quadros alinhados e esculturas sobre pedestais, a mostra explora a ideia da tridimensionalidade com peças suspensas, obras que emergem das paredes e trabalhos dispostos no chão, estimulando a exploração e a experiência corporal. “Queríamos que o espaço fosse um local de encontros e fricções. Romper com a ideia de que a pintura deve estar na parede e a escultura no chão. As obras não estão dispostas de forma linear; elas se cruzam, convidando o visitante a circular, se aproximar, contornar. A exposição é uma experiência que mobiliza corpo, percepção e emoção”, destaca a curadora.

Para ela, Grafismos de Pequenas Singularidades vai além da contemplação: é um convite para a evocação de memórias e a provocação de perguntas. “As obras podem remeter ao piso da casa da avó, a brinquedos de infância ou a paisagens familiares. Esse é o encontro que buscamos: entre a obra e a história de quem a observa”, afirma. Ao colocar a identidade no centro da experiência – sem, contudo, oferecer respostas fechadas – a exposição estimula o público a se reconhecer, se questionar e, sobretudo, sentir.

Integrante do programa Sesc Pulsar, a mostra reafirma o compromisso da instituição com a promoção da cultura, da diversidade e do pensamento crítico. Aberta ao público até meados de junho, “Grafismos de Pequenas Singularidades” conta com entrada gratuita e programação paralela que inclui visitas mediadas e conversas com os artistas.

SERVIÇO:
Grafismos de Pequenas Singularidades
Local: Sesc Teresópolis – Galeria de Arte e Corredor Interno
Período: 14 de março a 15 de junho de 2025
Horário: Terça a domingo, das 9h às 18h
Entrada gratuita

Para mais informações, acesse o site do Sesc Teresópolis ou entre em contato pelo telefone da unidade.

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