Convidando o público a vivenciar, de forma sensorial e imersiva, a dura realidade dos migrantes e refugiados que atravessam desertos e oceanos em busca de uma nova vida, o espetáculo “Migrantes”, do premiado dramaturgo romeno-francês Matéi Visniec, ganha uma montagem brasileira impactante, com adaptação e direção de Rodrigo França. A temporada estreia dia 12 de junho às 19h no Teatro Firjan Sei Centro, e expõe de maneira crua e impactante a realidade dos deslocamentos humanos forçados, mergulhando o público na experiência daqueles que atravessam desertos e oceanos em busca de sobrevivência.
A montagem apresenta uma narrativa fragmentada, onde diferentes personagens e situações se entrelaçam, compondo um grande mosaico sobre a migração contemporânea. O texto de Visniec traz à tona o desespero, a resiliência e a brutalidade enfrentada por milhões de pessoas ao redor do mundo, oferecendo um retrato poderoso da crise migratória global.
“O texto pulsa atualidade, questiona as estruturas de poder e nos força a olhar para o que tentamos ignorar — e isso sempre me interessa. Conheci o texto em um momento em que eu buscava uma obra que tivesse ressonância política, sensível e poética ao mesmo tempo. E senti imediatamente que havia ali uma potência teatral que precisava ser vista e vivida pelo público brasileiro”, ressalta Rodrigo, que tem como objetivo provocar o púbico com sua adaptação do texto original.
Dentre as maiores satisfações da montagem para Rodrigo França está a reunião de um elenco coeso e numeroso: são nove os artistas em cena – Alex Nader, Aline Borges, Anderson Cunha, Mery Delmond, Monique Vaillé, Paulo Guidelly, Sarito Rodrigues, Stella Maria Rodrigues e Tom Nader. “Tenho a alegria de dizer que estou dirigindo esse espetáculo com um verdadeiro elenco dos sonhos — artistas que há décadas fazem teatro com excelência, seriedade e entrega. É raro e, ao mesmo tempo, emocionante, oferecer ao público a oportunidade de ver tantos grandes atores juntos em cena. Algo que ficou raro no Rio de Janeiro”, analisa.
A encenação dirigida por França não se limita a contar histórias: ela transforma o público em testemunha e cúmplice da travessia. Projeções, efeitos sonoros e uma ambientação sensorial criam a sensação de deslocamento constante, fazendo com que o espectador sinta o peso da jornada daqueles que deixam tudo para trás. O oceano, por vezes visto como um horizonte de esperança, torna-se um cemitério invisível para milhares de vidas interrompidas. O deserto, uma promessa de passagem, se revela um lugar onde o tempo se dissolve em poeira e silêncio.
“Visniec tem uma escrita poderosa, carregada de ironia e poesia, e sua obra nos desafia como artistas. É um texto que te leva ao limite e exige que você seja ético e criativo ao mesmo tempo, e a adaptação aproxima a obra do nosso contexto. Inserimos cenas que dialogam diretamente com a experiência migratória nas Américas e com a perspectiva afro-diaspórica. A estrutura da peça foi respeitada, mas algumas cenas ganharam novos contornos, novas vozes. Quem conhece o texto original vai perceber diferenças – mas acredito que elas ampliam a potência da peça, sem perder a essência do que Visniec propõe”, pontua Rodrigo.
Ao longo da peça, o público é levado a diferentes cenários: campos de refugiados superlotados, barcos precários à deriva no mar, postos de controle militarizados e cidades que se tornam fortalezas contra aqueles que tentam atravessar suas fronteiras. Cada cena nos confronta com um dilema moral, seja o cinismo das autoridades, a impessoalidade da burocracia ou o tráfico humano que explora o desespero de quem não tem escolha. Entre o trágico e o absurdo, “Migrantes” lança um olhar satírico e cortante sobre a hipocrisia de um mundo que prega a liberdade, mas ergue muros cada vez mais altos.
“A racialização dos migrantes é central e a peça evidencia esse marcador racial de forma explícita, tanto na escolha do elenco quanto nas cenas, que denunciam o racismo estrutural por trás das políticas migratórias globais. Os europeus são bem vindos aqui e em qualquer lugar do mundo. No Brasil eu conheço mentes geniais que vieram do continente africano e estão em subemprego. Há cientistas, professores e engenheiros limpando chão por serem africanos. Mas o europeu aqui desenvolve o ofício de sua formação. Os que são impedidos de entrar, os que são descartáveis, os que morrem afogados são, em sua maioria, negros, indígenas, árabes, racializados…”, observa França.
Mais do que um espetáculo, “Migrantes” é uma experiência imersiva e necessária, que nos obriga a refletir sobre o significado de fronteiras, pertencimento e humanidade. Quem tem o direito de ficar? Quem merece ser acolhido? Quem define quem pertence aonde? Em tempos de crescente intolerância e desinformação, a peça nos convida a sair da apatia e a enxergar, nos rostos e vozes dos migrantes, o reflexo de nossas próprias histórias e identidades.
“Desejo que a plateia se sinta interpelada, mobilizada, tocada, atravessada. Queremos que o público se sinta cúmplice – e ao mesmo tempo incomodado. Vamos usar o corpo, a luz, o som, a proximidade, tudo o que puder quebrar a anestesia coletiva. E o impacto visual será fundamental porque imagens fortes são como rupturas na narrativa: fazem com que o espectador pare de observar e comece a sentir. A dor, a esperança, o medo, o absurdo — tudo isso precisa ser visível. O espetáculo não oferece respostas prontas, mas convida a refletir e sentir. É uma obra intensa e, por vezes, desconfortável — como deve ser todo encontro com a verdade”, conclui Rodrigo França.
SERVIÇO
“Migrantes”
- Temporada: 12 de junho a 13 de julho de 2025
- Horário: Quintas e sextas-feiras, às 19h; sábado e domingo, às 18h
- Ingressos: R$ 20 (meia-entrada) / R$ 40 (inteira)
- Link para ingressos antecipados: https://bileto.sympla.com.br/event/105881
- Local: Teatro Firjan SESI Centro
- Endereço: Av. Graça Aranha, nº 1 – Centro – Rio de Janeiro
- Classificação Indicativa: 12 anos
- Duração: 90 minutos
- Instagram: @migrantes_teatro
FICHA TÉCNICA
- Dramaturgia: Matéi Visniec
- Tradução: Luciano Loprete
- Adaptação e Direção: Rodrigo França
- Elenco: Alex Nader, Aline Borges, Anderson Cunha, Mery Delmond, Monique Vaillé, Paulo Guidelly, Sarito Rodrigues, Stella Maria Rodrigues e Tom Nader
- Diretor Assistente: Kennedy Lima
- Direção de Movimento: Valéria Monã
- Dramaturgia Sonora e Trilha Original: Dani Nega
- Direção de Arte e Cenografia: Mauro Vicente
- Iluminação: Pedro Carneiro
- Figurinos: Vania Ms Vee
- Visagismo: Diego Nardes e Lucas Tetteo
- Camareira: Cacierly Tiengo
- Assessoria de Imprensa: Marrom Glacê Comunicação – Gisele Machado e Bruno Morais
- Fotos: Marcio Farias
- Direção de Produção: Rodrigo França e Caio Ferreira
- Produção Executiva: Deborah Oliveira
- Realização: Diverso Cultura e Desenvolvimento
Espetáculo inédito “Boate das Fadas” estreia em 19 de junho na Sala Multiuso do Sesc Copacabana

Boate das Fadas – foto: Dalton Valério
Na comédia “Sonho de uma Noite de Verão”, de William Shakespeare, a floresta mágica habitada por fadas, elfos e duendes é o cenário dos encontros e desencontros de quatro jovens amantes. Com idealização e dramaturgia de Julia Limp, “Boate das Fadas” é uma releitura do clássico, ambientada nos dias de hoje. Nesta comédia musical, a floresta dá lugar a uma casa noturna queer clandestina, onde os excluídos da sociedade são acolhidos, onde desejos e fantasias são vistos sem julgamentos. Dirigida por Gustavo Damasceno, “Boate das Fadas” estreia em 19 de junho na Sala Multiuso do Sesc Copacabana. O projeto foi contemplado pelo edital Sesc Pulsar 2024/2025.
A partir da linguagem do cabaré, com elementos de humor, sátira e erotismo, a peça discute gênero, sexualidade e corpos excluídos. Formado por sete aristas – Amarildo Moraes, Dai Ramos, Fernanda Chazan, Jeff Fagundes, Julia Limp, Marlon Vares e Michel Langer –, o elenco é acompanhado da musicista e diretora musical Rohl Martinez. Repleto de números musicais originais e muito humor, o espetáculo faz referência à cultura das casas noturnas e inferninhos LGBTQIAPN+ do Rio de Janeiro.
O núcleo principal da obra original, o quarteto amoroso formado por Hérmia, Lisandro, Demétrio e Helena, aqui é apresentado como dois casais homoafetivos. A casa noturna chamada Boate das Fadas é o palco para o desenrolar de um casamento proibido pelo patriarca influente da cidade, Egeu — que tenta forçar sua filha Hérmia a se casar com Demétrio, mas a jovem é apaixonada por Lisandra. Temendo o casamento forçado, as duas planejam se casar escondidas na boate.
“A boate se concretiza como esse lugar dos não aceitos, dos marginais, no sentido de quem não tem lugar na sociedade. É o local onde você pode ser quem você é. Acredito que essa mudança é grande virada em relação à obra original. É um espetáculo que fala dos desejos, cada cena é como se fosse um transe, um delírio”, diz Gustavo Damasceno.
Para criar as versões e paródias das músicas que permeiam a montagem, Julia partiu de um repertório brasileiro, tendo como influência o estilo brega, além da uma referência direta a atmosfera do musical “The Rocky Horror Show”. Há também a música tema da peça, “Abriu a Noite – Boate das Fadas”, composta em parceria com a diretora musical Rohl Martinez.
A montagem de “Boate das Fadas” celebra uma parceria familiar: Gustavo Damasceno e Julia Limp, pai e filha, já trabalharam juntos muitas vezes. Recentemente, estiveram em cena como atores na temporada paulistana de “Um Tartufo”, da Cia. Teatro Esplendor. “Quando eu era criança, meu pai me levava para os ensaios. Os meus primeiros trabalhos foram sempre ao lado dele. Sinto que, com o tempo, depois que realmente decidi trabalhar com teatro, conseguimos firmar uma parceria de muita escuta. Confio no olhar dele e na generosidade que esse olhar tem com o meu trabalho”, diz Julia Limp.
Ficha Técnica:
- Direção: Gustavo Damasceno
- Dramaturgia: Julia Limp
- Elenco: Amarildo Moraes, Dai Ramos, Fernanda Chazan, Jeff Fagundes, Julia Limp, Marlon Vares e Michel Langer
- Participação: Rohl Martinez
- Assistência de direção: Ayla Gabriela
- Direção de produção: Gabriel Garcia
- Direção musical: Rohl Martinez
- Figurino: Bidi Bujnowski
- Cenário: Carlos Anjos
- Caracterização: Raibolt
- Iluminação: Bruno Primo
- Designer gráfico: Amarildo Moraes (Carambola Estúdio)
- Assessoria de imprensa: Paula Catunda e Catharina Rocha
- Social media: Manu Calmon (Calmon Lab)
- Fotografia: Dalton Valério
- Coordenação geral: Faminta Produções
- Realização: Edital de Cultura Sesc RJ Pulsar
- Apoio: Clássico de Copa e Cantina Donanna
SERVIÇO
“Boate das Fadas”
- Temporada: De 19 de junho a 13 de julho de 2025
- Dias e horários: Quinta a domingo, às 19h
- Local: Sala Multiuso do Sesc Copacabana (Rua Domingos Ferreira, 160, Copacabana)
- Ingressos: R$ 10 (associado do Sesc), R$ 15 (meia-entrada) e R$ 30 (inteira)
- Informações: (21) 2547-0156
- Horário de funcionamento da bilheteria: de terça a sexta, das 9h às 20h. Sábados, domingos e feriados, das 14h às 20h.
- Classificação indicativa: 16 anos. Duração: 1h30min.
- Instagram: @boatedasfadas
OKAN, do grupo Xingó, inicia itinerância por São Paulo com dança e teatro de mulheres que evocam memórias diaspóricas

OKAN – Foto de Dalton Valério
Fruto de seis anos de pesquisa, o espetáculo OKAN marca o início de uma itinerância por três espaços culturais de São Paulo, com estreia no próximo dia 12 de junho no Teatro das Pretas – Centro Cultural Adebankê, que celebra 13 anos de atuação na Zona Leste, no bairro de Arthur Alvim. Combinando dança, teatro e brinquedo popular, a montagem traz ao centro da cena memórias de resistência e deslocamento evocadas por seis mulheres, em dramaturgia construída a partir de relatos de lideranças comunitárias, ex-presas políticas e fundadoras de movimentos sociais.
A circulação é parte do projeto “OKAN em afluências não binárias – LAROYE EXU”, contemplado pela 37ª edição do Programa Municipal de Fomento à Dança para a cidade de São Paulo. A proposta prevê uma ocupação artística em três territórios culturais da capital, com exibições do filme “BOIÁ” seguidas das apresentações do espetáculo OKAN.
O enredo do espetáculo parte de uma premissa ficcional — a perseguição de três mulheres foragidas conhecidas como Boneca, Caveira e Viola — que compõem um mosaico poético e político entrelaçado a fragmentos de fala, danças e música. Em fluxo contínuo entre corpo e palavra, o espetáculo combina ritmos populares, narrativa fragmentada e elementos de rito.
Com trilha musicada ao vivo pelas intérpretes, OKAN integra sons, texturas e símbolos: couro, chapéus, caveira, varais de fotos, esqueleto. A figura de Exu emerge como presença simbólica e poética — entre o silêncio e o riso. “Pra onde a gente vai agora?”, pergunta uma das intérpretes ao final, antes de convidar o público para a dança.
O grupo é composto exclusivamente por mulheres e dissidências de gênero, que encenam movimentações coletivas, falas sussurradas e jogos que interagem no palco com estruturas cênicas móveis. A obra propõe uma experiência sensorial e política, onde cada detalhe reforça sua dimensão ancestral: os figurinos em couro foram produzidos por Mestre Romualdo, em Arcoverde (PE); as camisetas utilizadas pertencem à coleção da historiadora Astrogilda Pereira; e a rede de linho foi bordada à mão pela bisavó de uma das intérpretes.
As entrevistas que deram origem à dramaturgia — com 17 mulheres mais velhas — também geraram vídeos publicados no Canal Heréticas. Criado em 2007, o Grupo Xingó desenvolve trabalhos nas interseções entre teatro, dança e formas de expressão populares. Com mais de dez prêmios recebidos — entre eles Fomento à Dança, ProAC, Aldir Blanc e Maria Alice Vergueiro —, o coletivo já circulou por aldeias, ocupações, assentamentos e periferias, mobilizando práticas artísticas como gesto político e coletivo.
Serviço
Espetáculo: OKAN
Grupo: Grupo Xingó
Classificação indicativa: 12 anos
Duração: Filme: 17min | Espetáculo: 55min
Entrada gratuita (retirada de ingressos pelo Sympla)
Temporada 1 – Teatro das Pretas – Centro Cultural Adebankê
Rua Durandé, 175, Artur Alvim – São Paulo/SP
12, 13, 15, 19, 20, 21 e 22 de junho de 2025
Quinta a sábado, às 20h | Domingo, às 19h | Sessão extra 15/06, às 15h
Acessível em Libras nos dias 20 e 21/06
Temporada 2 – Teatro Arthur Azevedo (Estacionamento)
Av. Paes de Barros, 955, Alto da Mooca – São Paulo/SP
30, 31 de julho; 01, 02 e 03 de agosto de 2025
Quarta a domingo, às 20h
Acessível em Libras nos dias 01 e 02/08
Temporada 3 – Centro Cultural São Paulo (Porão)
Rua Vergueiro, 1000, Liberdade – São Paulo/SP
07 a 10 de agosto de 2025
Quinta a sábado, às 20h | Domingo, às 19h
Acessível em Libras nos dias 08 e 09/08
Ações formativas e bate-papos: Detalhes e inscrições via Instagram do Grupo Xingó: @grupoxingo
Ficha Técnica
Realização: Grupo Xingó e Tekoha
Atuadoras: Erika Moura, Siufi, Valquíria Rosa, Ana Flor de Carvalho, Carolina Gracindo, Maria Helena Menezes, Sylvia Sato (Libras)
Direção: Juliana Pardo
Co-direção: Thais Dias
Dramaturgia: Siufi
Direção musical: Valquíria Rosa
Figurino e ornamentos: Mestre Romualdo Freitas e Ateliê Xongani
Rede e bordados: Margarete Siufi e Maria Jacques Miranda
Camisetas: Acervo Astrogilda Pereira
Apoio de Produção: Legina Leandro e Chidi Portuguez
Arte e identidade visual: Mari Moura
Social Media: Duda Lopes
Produção Executiva: Duda Viana
Assessoria de Imprensa: Pedro Madeira e Rafael Ferro
Herança escravocrata na região da Mooca, em São Paulo
Com direção e dramaturgia de Jé Oliveira, a adaptação do conto machadiano pode ser vista gratuitamente no Teatro Arthur Azevedo (12 a 22/06), na região da Mooca. A peça aborda a herança escravocrata e sua permanência nas desigualdades raciais de hoje.

Pai contra Mãe – Foto Marcelle Cerutti
O Coletivo Negro, grupo dedicado à pesquisa cênico-racial e à criação de narrativas que entrelaçam arte e urgência histórica, reestreia o espetáculo “Pai contra Mãe ou Você está me Ouvindo?”, livremente inspirado no conto de Machado de Assis. A montagem reúne os três integrantes fundadores do grupo em cena, ao lado de um trio de músicos convidados que executam ao vivo a trilha sonora original, com direção musical de Guilherme Kastrup — vencedor do Grammy com o disco “A Mulher do Fim do Mundo”, de Elza Soares. Contemplada pela 18ª edição do Prêmio Zé Renato, a produção marca os 17 anos do Coletivo Negro reafirmando sua relevância no teatro político contemporâneo.
A montagem tem como ponto de partida a sentença final do texto de Machado — “Nem todas as crianças vingam, bateu-lhe o coração.” —, que ressoa como síntese da crueldade de uma herança escravocrata ainda presente nas estruturas sociais brasileiras. Ao focar na trajetória de Candinho, homem negro desempregado e desesperado por sustentar a família, a dramaturgia expande o conto machadiano em direção a um campo de fricção com o presente.
“A encenação se inspira na reflexão de Achille Mbembe, que afirma: ‘o negro é o único cuja carne foi convertida em mercadoria’. Por isso, deslocamos parte da ação para o ambiente de um supermercado, símbolo da mercantilização do corpo negro. Essa recriação não apenas revê a violência histórica da escravidão, como propõe uma analogia direta com o racismo estrutural contemporâneo.”
– Jé Oliveira
A adaptação também tensiona as formas tradicionais de se encenar Machado de Assis. Para Oliveira, sua obra não pode ser dissociada da negritude de seu autor nem interpretada de forma escapista às questões raciais. O espetáculo, assim, busca ressignificar o conto, evidenciando as continuidades entre o Brasil escravocrata e o Brasil de hoje.
“A analogia de corpos como mercadoria num supermercado nos parece determinante. Quando uma mulher negra é mantida em cárcere por mexer na própria bolsa ou seguida dentro de uma loja, isso não é exceção — é estrutura. Segundo levantamento do Observatório do Terceiro Setor, quase 70% das pessoas negras afirmam já terem passado por isso”, pontua o diretor.
A montagem reúne todos os membros fundadores do Coletivo Negro — Aysha Nascimento, Flávio Rodrigues, Jé Oliveira e Raphael Garcia — em uma criação coletiva que reafirma a maturidade do grupo e sua relevância no teatro político contemporâneo. Com direção musical de Guilherme Kastrup (vencedor do Grammy com A Mulher do Fim do Mundo, de Elza Soares), a trilha é executada ao vivo, somando à encenação um pulso rítmico que costura cena, corpo e tempo.
SINOPSE
Um narrador nos conta a história de Zaíra da Conceição, mulher negra, retinta, grávida. E de Osvaldo, homem negro que acaba de se tornar pai. Ela está desempregada; ele acaba de ser contratado por uma rede de varejo. Zaíra sofre uma acusação infundada de roubo no supermercado. A partir daí, dois destinos colidem em uma disputa imposta pelas estruturas da desigualdade: pai contra mãe.
A MÚSICA NA CONSTRUÇÃO CÊNICA
A fusão entre teatro e música em Pai contra Mãe ou Você está me Ouvindo? ultrapassa a função de ambientação sonora e torna-se elemento essencial da narrativa. Em cena, um trio de músicos acompanha os intérpretes e dialoga com a ação: Lua Bernardo (baixo acústico e elétrico, sopros e voz), Maurício Pazz (bandolim e guitarra Afro Atlântica) e Thiago Sonho (percussão, bateria, samplers e voz).
No contexto do teatro épico, a música assume o papel de comentar a ação, criar contrastes e intensificar a experiência estética e emocional do público.
“Com seu poder de síntese, as canções originais, executadas por uma banda ao vivo, podem acessar outras formas de fruição, podendo ir além do intelecto. Isso enriquece muito a obra, ajudando a alcançar também outros públicos, com interesses diversos, no que diz respeito à linguagem do espetáculo.”
– destaca o encenador.
Ao se tornar elemento estruturante da encenação, a música aproxima a montagem de diversas tradições cênicas e expande seu alcance, promovendo uma experiência mais sensorial, imersiva e acessível a públicos com diferentes formações e sensibilidades.
Ficha Técnica
Idealização, Concepção, Dramaturgia e Direção Geral: Jé Oliveira
Assistência de Direção: Rodrigo Mercadante
Atuação: Aysha Nascimento, Flávio Rodrigues, Raphael Garcia
Direção de Movimento e Coreografia: Aysha Nascimento
Direção Musical: Guilherme Kastrup e Jé Oliveira
Banda ao vivo:
Baixo Acústico e Elétrico, Sopros e Voz: Lua Bernardo
Bandolim, Violão, Guitarra, Cavaco e Voz: Maurício Pazz
Percussão, Bateria, Samplers e Voz: Thiago Sonho
Composições Originais: Jé Oliveira e Jonathan Silva
Melodias: Jonathan Silva
Arranjos: Guilherme Kastrup, Jé Oliveira, Lua Bernardo, Maurício Pazz e Thiago Sonho
Preparação de canto: William Guedes
Videografia: Bianca Turner
Desenho de Luz: Matheus Brant
Assistência e Operação de Luz: Aline Sayuri
Figurinos: Eder Lopes
Costureira: Nininha Lopes
Cenografia: Flávio Rodrigues
Cenotécnico: Wanderley Wagner
Serralheiro: Mauricio Batista
Engenharia de Som: Tomé de Souza
Contrarregras: Flávio Serafin e Helen Lucinda
Fotos: Marcelle Cerutti e Matheus José Maria
Identidade Visual: Murilo Thaveira
Participação em Vídeo: Lilian Regina e Sidney Santiago Kuanza
Estudos teóricos e oficinas: Aysha Nascimento, Flávio Rodrigues, Jé Oliveira e Raphael Garcia
Produção Executiva: Catarina Milani
Assistência de Produção: Éder Lopes
Produção Geral: Gira Pro Sol Produções – Jé Oliveira
Assessoria de Imprensa: Pedro Madeira e Rafael Ferro
SERVIÇO
Pai contra Mãe ou Você está me Ouvindo?
TEATRO ARTHUR AZEVEDO
Av. Paes de Barros, 955 – Mooca – São Paulo – SP
Qui, 12/06, às 17h e às 21h | Sex, 13/06, às 17h e às 21h
Sáb, 14/06, às 21h | Dom, 15/06, às 19h
Qui, 19/06, às 17h e às 21h | Sex, 20/06, às 17h e às 21h
Sáb, 21/06, às 21h | Dom, 22/06, às 19h
Entrada gratuita – Retirada de ingressos 1h antes de cada sessão
Duração: 90 minutos
Classificação indicativa: 16 anos

Sou formada em jornalismo pela Universidade Gama Filho, apaixonada por
eventos culturais, em especial o teatro, que nos faz viajar, pensar, sonhar,
sorrir, chorar e amar.