Quando Claire Randall tocou nas pedras de Craigh na Dun há mais de dez anos, poucos imaginavam que aquela enfermeira transportada de 1945 para 1743 daria origem a um universo tão rico e complexo. Outlander se tornou fenômeno justamente por conseguir equilibrar elementos que, no papel, pareciam incompatíveis: romance épico, drama histórico, fantasia temporal e discussões sociais relevantes sobre o papel da mulher na sociedade.
Agora, com sua spin-off Outlander: Blood of My Blood, o universo criado por Diana Gabaldon ganha uma expansão que não apenas honra o legado da série original, mas ousa reescrever algumas de suas bases fundamentais. O resultado é uma prequela que funciona tanto para veteranos quanto para novatos, provando que as Terras Altas escocesas ainda guardam segredos fascinantes.
O retorno às origens que os fãs tanto pediram

Família Fraser – Outlander / Reprodução StarZ
Blood of My Blood faz algo que muitos apaixonados pela série (e pelos livros) ansiavam: voltar às raízes escocesas que tornaram Outlander irresistível em suas primeiras temporadas. Enquanto a série principal se aventurou por diferentes épocas e continentes ao longo de oito temporadas, perdendo um pouco daquela magia selvagem das Terras Altas, o spin-off nos transporta diretamente para 1714, mergulhando diretamente nas intrigas políticas dos clãs MacKenzie e Fraser.
A ideia é inteligente: acompanhar duas histórias de amor paralelas que moldaram o destino dos protagonistas que conhecemos. De um lado, temos Brian Fraser e Ellen MacKenzie, os pais de Jamie, navegando pelas complexas disputas de poder após a morte do chefe do clã. Do outro, os pais de Claire, Julia e Henry Beauchamp, que descobrimos serem também viajantes no tempo, transportados da Primeira Guerra Mundial para o século XVIII.
O cenário histórico é impecável, com o excelente design de produção trazendo de volta aquela atmosfera densa e envolvente das primeiras temporadas de Outlander. Os kilts, os castelos medievais, as paisagens nebulosas das Terras Altas e aquela tensão constante entre clãs rivais estão todos lá, servidos com a nostalgia certa na medida certa.
Personagens que ecoam o DNA Fraser
Uma das grandes virtudes de Blood of My Blood está no desenvolvimento dos personagens principais. Ellen MacKenzie, interpretada por Harriet Slater, carrega traços inconfundíveis que explicam a personalidade forte e independente que Jamie herdaria. Sua luta por autonomia em uma sociedade patriarcal do século XVIII ressoa diretamente com as batalhas que Claire enfrentaria décadas depois.
Brian Fraser, vivido por Jamie Roy, exala o mesmo magnetismo e código de honra que reconhecemos em seu filho. A química entre os dois protagonistas é eletrizante e justifica perfeitamente o amor épico que geraria um dos casais mais marcantes da televisão.
Do lado dos Beauchamp, Hermione Corfield e Jeremy Irvine entregam performances convincentes como Julia e Henry, estabelecendo paralelos claros com Claire sem cair na armadilha de criar meras cópias dos personagens originais. A dinâmica deles como viajantes no tempo desorientados evoca o início de Outlander, mas com personalidade própria.
A ousadia de mexer em uma marca já estabelecida
Aqui chegamos ao ponto onde Blood of My Blood demonstra real coragem criativa. O showrunner Matthew B. Roberts não se contentou em contar uma história paralela segura; ele decidiu reescrever elementos fundamentais da mitologia de Outlander. E isso merece ser discutido com cuidado para não estragar surpresas.
ATENÇÃO: A partir deste ponto, vou abordar revelações específicas da primeira temporada de Blood Of My Blood que podem ser consideradas spoilers importantes.
A grande reviravolta da série está na revelação de que os pais de Claire não morreram em um acidente de carro em 1923, como sempre acreditamos. Julia e Henry Beauchamp também são viajantes no tempo, transportados pelas mesmas pedras de Craigh na Dun que a filha usaria anos depois. Essa mudança não é apenas uma surpresa narrativa; ela redesenha completamente a jornada de Claire na série original.
Imagine a complexidade emocional da trama: Claire cresceu acreditando ser órfã, criada pelo Tio Lamb, sem saber que seus pais estavam vivos, presos em outra época, passando pelas mesmas provações que ela enfrentaria. A ironia é devastadora e adiciona camadas de tragédia familiar que enriquecem todo o universo da série.
A decisão de transformar Julia e Henry em viajantes temporais também resolve algumas inconsistências narrativas da trama de Outlander. Explica a facilidade com que Claire se adaptou ao século XVIII, sua intuição sobre a viagem no tempo e até mesmo alguns de seus conhecimentos que pareciam anacrônicos para uma enfermeira dos anos 1940.
Intrigas políticas que importam, e muito!
Além dos romances centrais, Blood of My Blood acerta em cheio ao construir um cenário político denso e consequente. A disputa pela liderança do clã MacKenzie entre os irmãos Colum e Dougal não é apenas pano de fundo; é o motor que movimenta todas as outras tramas. Ellen se vê no centro dessa tensão, sendo pressionada a um casamento político que selaria alianças, mas seguindo seu coração em direção a Brian Fraser.
Essas dinâmicas de poder não soam artificiais porque conhecemos o destino dessas famílias. Sabemos que Colum se tornará o líder do clã, que Ellen e Brian terão Jamie, que as escolhas feitas neste período ecoarão por gerações. Isso cria uma tensão dramática única, onde cada decisão carrega o peso do futuro que já conhecemos.
O veredito de quem ama o universo Outlander como eu
Blood of My Blood consegue a proeza de satisfazer a nostalgia dos fãs veteranos enquanto oferece um ponto de entrada acessível para novatos. Para quem acompanha Outlander desde o início e sentia falta daquela magia escocesa das primeiras temporadas, a série é um presente e para quem quer entender por que esse universo conquistou milhões de espectadores mundo afora sem precisar maratonar oito temporadas, é a porta de entrada perfeita.
A série prova que ainda há muito a ser explorado neste universo rico e complexo. Com dez episódios na primeira temporada e renovação já confirmada, Blood of My Blood se estabelece como uma expansão inteligente que honra o legado de Outlander enquanto cria sua própria identidade.
É Outlander em sua essência mais pura: amor que transcende o tempo, personagens complexos lutando contra as limitações de suas épocas, e aquela pitada de magia que faz acreditarmos que o impossível pode acontecer quando duas pessoas se encontram no momento certo, mesmo que seja na época errada.
Blood Of My Blood está disponível aos sábados no Disney+, inclusive no Brasil

Carioca com alma paulista. Jornalista Digital, Assessora de Imprensa, Escritora, Blogueira e Nerd. Viciada em séries de TV, chocolate, coxinha & Pepsi.