Pare para pensar, vivemos em uma sociedade obcecada na juventude eterna. Corpo sarado, rosto sem marcas do tempo, entre outras miragens “externas” que compramos para nos encaixar nas aceitações sociais. Não sou contra quem faz exercícios, afinal como dizia o poeta romano Juvenal (55 e 60 d.C. e morreu por volta de 127 d.C.) “Mens sana in corpore sano”, ou seja, “uma mente sã em um corpo são”, esta sanidade e que estamos perdendo, pois estamos nos tornando escravos deste modismo e não para envelhecer bem e com saúde. Porque envelhecer naturalmente sem aditivos virou quase uma vergonha, algo a ser combatido, escondido e negado. A margem disso tudo, o Brasil em 2050 chegara a ter mais idosos do que crianças segundo os órgãos especializados. Mas a pergunta que a sociedade precisa fazer e com certa urgência é: estamos nos preparando para o envelhecimento populacional?
Desde a antiguidade na Grécia seus pensadores, já debruçavam sobre o tema e refletiam sobre o que é envelhecer bem, sobre a necessidade de dignidade em todas as fases da vida. Cícero um desses pensadores escreveu um tratado completo sobre o tema (De Senectute/ Sobre a velhice), ele defende como a velhice pode ser a melhor etapa da vida, quando vivida com propósito e virtude. Infelizmente hoje no Brasil estamos como aquela musica da Legião Urbana “E esquecer a nossa gente, que trabalhou honestamente a vida inteira e agora não tem mais direito a nada”, falta dignidade para envelhecer com paz, descanso e plenitude.
As garantias constitucionais é o papel do Estado
A Carta Cidadã, nossa Constituição de 1988, não deixa dúvidas: o Estado deve amparar todos os idosos, garantindo seu bem-estar, direito á vida e sua dignidade, tão menosprezada nos dias de hoje. No papel não falta leis e estatutos, como Estatuto do Idoso, leis e politicas de saúde, proteção contra violência e abandono. Entretando o abismo que está entre o escrito e a via crucis que todo idoso passa para viver com dignidade e imensa.
Filas intermináveis no INSS, aposentadorias que não pagam nem os remédios, hospitais lotados onde nossos idosos se aglomeram nos corredores. Sem contar talvez o mais cruel, o abandono de seus familiares, que os colocam em asilos e os esquecem, domestica ou não tudo isso e uma violência “silenciosa”, mas que faz muito barulho em nossas consciências se e que não á perdemos.
Precisamos cobrar de nossos representantes eleitos, leis mais eficazes e justas, que atendam de pronto esta demanda para uma parcela da sociedade que só aumenta.
A questão da dignidade humana
Do ponto de vista filosófico, uma sociedade não é medida pela forma que trata seus indivíduos mais produtivos e sim como tratamos os que envelhecem, os vulneráveis e todos aqueles que não “produzem mais”, devemos pensar com que valores estamos construindo a nossa sociedade e que tipo de legado vamos deixar para as futuras gerações. Essas desigualdades que são o verdadeiro teste moral de uma civilização.
Como disse Cícero (filósofo romano em 106 a.c) “A velhice não deve ser combatida, mas honrada”.
Simone de Beauvoir (filosofa e escritora francesa – 1908/1986) em sua expendida obra A Velhice, faz uma critica devastadora sobre este tema, alertando como a sociedade festeja a juventude como passaporte para vida, tratando como descartável e erro de percurso a velhice. Não é como o tempo vai passando que destrói o ser humano, mas o descaso da sociedade que o faz sentir descartável.
Acontece infelizmente ainda e talvez com mais força nos dias de hoje, neste mundo coorporativo e numérico, onde o veredito cruel e o idoso se tornar invisível, um fardo, alguém que “já deu o que tinha que dar”. Numa sociedade obcecada por números, metas e produtividade, quem não produz nos seus parâmetros é apagado, desqualificado e esquecido.
Em tempos atrás os cabelos brancos dos anciãos eram tratados com respeito e símbolo de sabedoria, hoje são condenados ao silencio e ostracismo.
Ponto de virada é mudar a mentalidade humana
A proteção que a constituição garante não pode ficar só na letra morta, ou com palavras jogadas fora em púlpitos religiosos ou políticos, precisamos de um movimento humano e social, que envolvam seria e sinceramente toda a sociedade, para transformar palavras em ações, leis e orçamentos que sejam direcionados para esta demanda extremamente urgente.
A filosofia nos ensina que a sociedade para ser justa com equidade e igualdade, precisa ser inclusiva de verdade, não só no discurso bonito, precisamos principalmente mudar nossa mentalidade, ter um olhar para a velhice não como algo em decadência, mas como curso natural da vida, rica de sabedoria, experiencia, pois em uma perspectiva histórica se não sabemos de onde viemos, como podemos ter certeza para onde vamos, certamente essa escolha ficaria mais fácil se aprendermos com quem já esteve lá e tem conhecimento de causa, que calejou as mãos mesmo, que errou, que acertou. E que certamente está em um canto empoeirado esquecido, só esperando para hidratar com um rio de sabedoria e que vai certamente curar várias de nossas feridas. Afinal todos nos somos mortais, todos erramos, todos somos frágeis, todos sem exceção dependemos uns dos outros e todos nós envelhecemos, acordar para isso não é fraqueza, não é vergonha e ter humanidade. E honrar e construir uma sociedade melhor que proteja realmente quem precisa e já deu tanto por nós.
Termino com este poema de Mario Quintana.
Nascer é uma possibilidade
Viver é um risco
Envelhecer é um privilégio!
Teólogo e Filósofo em formação e curioso sobre o sentido da vida. Apaixonado por aprender, ensinar e inspirar reflexão.