Claudia tem 56 anos. Trabalhou 30 anos como professora, criou dois filhos num apartamento apertado do subúrbio e, no último ano, viu o caçula, Gabriel, de 28, trocar o Brasil por uma cidade europeia. “A primeira semana foi de silêncio total”, diz ela. “A segunda veio com mensagens esporádicas, passou a sensação de que eu não posso mais mandar, opinar, nem participar como antes. Fui educada para ser presença constante, hoje me falam que ‘o filho não é meu, é um cidadão do mundo’. É um luto.”
O relato de Claudia resume um fenômeno social e psicológico que vem se acelerando, país com mais de 50 anos, criaram filhos para um mundo que valorizam a autonomia, direitos individuais e fronteiras pessoais rígidas. E quando o ninho esvazia, esses pais se deparam com um duplo impacto. Primeiro, o óbvio, a ausência física e o fim de uma rotina que dava sentido. Segundo a perda de um papel social e emocional, o de agente ativo na vida dos filhos, numa era em que o discurso dominante reforça que “o filho não é seu.”
Do ponto de vista psicanalítico, a situação mobiliza processos fundamentais, separação individuação e o luto. Criar um filho implica, ao mesmo tempo, promover a autonomia do outro e resistir à sua saída. Pais 50+ carregam expectativas conscientes e inconscientes, de continuidade intergeracional, cuidados recíprocos e identificação. Quando os filhos afirmam sua cidadania plena, impõem fronteiras que perturbam essas expectativas. Surge então, um sentimento ambivalente, orgulho e alegria pela autonomia conquistada, e uma perda que pode ser sentida como rejeição, inutilidade ou aniquilamento do projeto de vida.
Emoção e Cultura diferenciadas
Além do emocional, há um conflito cultural, esses pais cresceram num mundo em que a família nuclear era a primeira instância de decisão. Seus filhos, principalmente, entre 22 e 35 anos, foram educados numa cultura que prioriza o indivíduo, a consensualidade e a privacidade digital. O resultado é um choque de mapas identitários.
Os jovens valorizam ter controle sobre suas escolhas, manter privacidade e definir seus próprios limites, incluindo, quanto irão ou não, compartilhar com os pais. Experimentam os atrasos em casamento, compra de imóvel e parentalidade, devido às incertezas econômicas. O importante para essa geração é a realização profissional e escolhas pessoais. Alguns seguem como nômades digitais.
É possível perceber uma maior procura por terapia, reconhecimento de limites emocionais e preferência por relações pautadas no diálogo e no consentimento. São ativistas, preocupação com causas como: meio ambiente, justiça social e novas formas de comunidade, estão presentes. E a preferência por comunicação pontual em vez de contato presencial é constante. Esses caminhos explicam por que muitos jovens mantêm vínculos, mas com menor dependência e mais seletividade, o que para muitos pais, é interpretado como distância afetiva.
A dor da ausência não desaparece por decreto, mas pode ser trabalhada. A proposta é abordagens práticas e reflexivas, integrando escuta clínica e soluções cotidianas.
Dizer “isso me dói” é o primeiro passo para evitar agir por raiva ou culpabilização. O luto do ninho é legítimo. Ofereça suporte sem invadir. Pergunte ao filho como ele quer ser acompanhado e negocie formas de contato. Aceitar um papel mais consultivo preserva a relação. Invista em hobbies, estudos, trabalho voluntário, viagens ou em relações sociais que tenham vida própria. Projetos substituem a função única de cuidado por múltiplas fontes de sentido. Fortaleça amizades, retomando vínculos parceiros, familiares e comunidade. Reconheça que é possível amar e sentir saudade ao mesmo tempo em que se sente alívio, orgulho ou raiva. A ambivalência é parte do vínculo humano.
Momento de uma nova aliança possível
O choque entre gerações não precisa significar ruptura. É possível construir uma nova aliança, os filhos ganham autonomia, os pais reinventam seu papel. Em vez de entender a distância como rejeição, é útil enquadrá-la como uma reorganização relacional. Da mesma forma que os pais ensinaram autonomia, agora podem exercê‑la sobre si mesmos. Escolher novos rumos, aceitar limites e cultivar outras formas de presença afetiva.
No fim, o desafio é simbólico e existencial, transformar um luto em redirecionamento. Para muitos pais 50+, essa transição é uma oportunidade de viver a própria vida com a mesma intensidade com que cuidaram da dos filhos. E, quando a troca é possível, pautada no respeito às fronteiras e na afetividade, o laço familiar muda de forma, mas não necessariamente perde sua essência.
@gracaduartecomunicacao
@mentesaudavelterapias

Graça Duarte, 57 anos, Brasileira, Jornalista, Escritora, Psicanalista e Parapsicóloga. 32 anos de atuação nas áreas de comunicação, empreendedorismo e bem-estar. Abordagem integrativa e humanizada.