A cidade de São Paulo viveu um Natal atípico e sufocante em 2025, estabelecendo um novo marco climatológico que reflete a intensidade dos fenômenos extremos recentes. Dados confirmados pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) indicam que a estação convencional do Mirante de Santana, na Zona Norte, registrou 35,9°C na tarde de quinta-feira (25). Esta temperatura não apenas consagra o dia 25 de dezembro mais quente da história paulistana, mas também quebra o recorde mensal que perdurava há décadas, superando os 35,6°C de 1998 e se posicionando como a maior marca para o mês desde 1961. O calor extremo, potencializado por um bloqueio atmosférico que impediu a chegada de frentes frias, transformou a capital em uma ilha de calor urbana, afetando drasticamente a sensação térmica da população.
O fenômeno não se restringiu apenas à quebra de recordes numéricos, mas sinalizou uma mudança perigosa no padrão de conforto térmico esperado para o início do verão. O Inmet e a Defesa Civil emitiram alertas de nível “Laranja” (Perigo) e “Amarelo” para ondas de calor que cobrem boa parte do Sudeste e Centro-Oeste, com temperaturas permanecendo 5°C acima da média por dias consecutivos. No Rio de Janeiro, a situação foi igualmente crítica, com termômetros superando os 40°C em dias seguidos, consolidando uma semana de Natal de calor opressivo em toda a região. A massa de ar quente e seco, atuando como uma tampa sobre as cidades, inibiu a formação de nuvens de chuva durante o feriado, permitindo a incidência solar direta e contínua.
Agora, a atenção meteorológica se volta para a ruptura brusca desse padrão, prevista para ocorrer ao longo desta sexta-feira (26) e sábado (27). A aproximação de uma frente fria e a instabilidade gerada pelo próprio calor excessivo criam o cenário ideal para tempestades severas. O choque térmico entre a atmosfera superaquecida e a umidade que chega deve provocar chuvas intensas, ventos fortes e potencial para granizo em pontos isolados. As autoridades alertam para o risco de alagamentos e quedas de árvores, comuns quando o solo impermeabilizado da metrópole recebe grandes volumes de água em curto espaço de tempo após dias de estio intenso.
O caldeirão atmosférico de dezembro
A dinâmica que levou aos 35,9°C em São Paulo é explicada por um sistema de alta pressão em médios níveis da atmosfera, que estacionou sobre o Brasil Central e expandiu sua influência para o Sudeste. Esse sistema funcionou como um domo, bloqueando o avanço de massas polares e comprimindo o ar próximo à superfície, o que gera o aquecimento adiabático — processo físico onde o ar comprimido esquenta. Historicamente, dezembro é um mês chuvoso em São Paulo, o que costuma regular as temperaturas máximas; contudo, a ausência de nebulosidade permitiu que a radiação solar atingisse o solo com eficiência máxima justamente no período próximo ao solstício de verão, quando os dias são mais longos.
Comparativamente, os dados históricos do Mirante de Santana mostram a excepcionalidade deste evento. O recorde anterior de 35,6°C, datado de 3 de dezembro de 1998, ocorreu em um ano sob forte influência do El Niño, padrão que também se manifesta com intensidade variável nos ciclos climáticos atuais. A superação dessa marca em pleno dia de Natal sugere que as ilhas de calor urbanas, somadas às mudanças climáticas globais, estão elevando o “teto” das temperaturas máximas possíveis para a capital paulista. Especialistas apontam que a recorrência de recordes quebrados — outubro de 2025 também teve dias acima de 35°C — indica uma tendência de tropicalização agressiva do clima subtropical da cidade.
Além dos fatores macroclimáticos, a urbanização densa de São Paulo agrava o quadro, impedindo o resfriamento noturno. O concreto e o asfalto absorvem calor durante o dia e o liberam lentamente à noite, mantendo as mínimas elevadas e impedindo o descanso térmico do corpo humano. Durante esta onda de calor, as madrugadas registraram temperaturas acima de 23°C, classificadas como noites tropicais, o que contribui para o estresse fisiológico da população e aumenta a demanda por refrigeração artificial, sobrecarregando o sistema elétrico justamente nos horários de pico.
Impactos na saúde e infraestrutura
A persistência de temperaturas extremas exige cuidados redobrados com a saúde pública, especialmente para grupos vulneráveis como idosos, crianças e pessoas com doenças cardiorrespiratórias. A exposição prolongada ao calor acima de 32°C, combinada com a baixa umidade relativa do ar que atingiu níveis críticos nas tardes recentes, favorece quadros de desidratação, insolação e agravamento de condições crônicas. O Ministério da Saúde e a Defesa Civil recomendam evitar exercícios físicos ao ar livre entre 10h e 16h, além da ingestão constante de líquidos, uma vez que a perda de água pelo organismo é acelerada nessas condições, muitas vezes sem que a sede seja percebida imediatamente.
No campo da infraestrutura, a onda de calor pressiona o fornecimento de energia e água. O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) monitora a carga de energia, que tende a bater recordes devido ao uso massivo de aparelhos de ar-condicionado e ventiladores. Embora o sistema brasileiro esteja robusto, a distribuição local (baixa tensão) sofre com transformadores superaquecidos e picos de consumo, podendo gerar blecautes pontuais em bairros residenciais densos. Paralelamente, o consumo de água dispara, exigindo que a população faça uso consciente para evitar quedas de pressão nas redes de distribuição, comuns em dias de calor extremo.
A transição para o período chuvoso, que se inicia nesta sexta-feira, traz outro tipo de risco para a infraestrutura urbana. A tempestade prevista carrega o potencial de ventos superiores a 60 km/h, capazes de derrubar árvores já enfraquecidas ou atingir a fiação elétrica aérea. A Defesa Civil de São Paulo mantém o estado de atenção para alagamentos intransitáveis, recomendando que a população evite áreas de várzea e não enfrente enxurradas. A combinação de solo quente com água fria da chuva também pode gerar granizo, causando danos a telhados e veículos, um desfecho violento típico de verões sob anomalias térmicas.
Raio-X do calor recorde
Para compreender a dimensão do evento climático desta semana, compilamos os dados essenciais divulgados pelo Inmet e centros de monitoramento:
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Recorde Atual: 35,9°C (25/12/2025) – Maior temperatura para dezembro desde 1961.
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Recorde Anterior de Dezembro: 35,6°C (03/12/1998).
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Recorde do Ano (até o momento): Superou os 35,1°C registrados em 06/10/2025.
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Rio de Janeiro: Máximas acima de 40°C, com sensação térmica superando 50°C em Guaratiba.
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Previsão Imediata: Queda de temperatura a partir da tarde de 26/12, com entrada de umidade.
Serviço
Alerta Meteorológico Inmet/Defesa Civil
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Abrangência: Grande São Paulo, Litoral, Interior (Ribeirão Preto, Bauru), Rio de Janeiro e Sul de Minas.
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Vigência do Alerta de Calor: Até 18h de sexta-feira, 26 de dezembro de 2025.
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Risco de Tempestade: Alto a partir da tarde de sexta-feira (26) e durante o sábado (27).
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Telefones de Emergência: 199 (Defesa Civil) e 193 (Bombeiros).