Por que as séries médicas fazem tanto sucesso? ‘The Pitt’ chega e prova que a fórmula ainda funciona

Montagem feita por Ana Magal com imagens reprodução de diversas emissoras

Peço desculpas pelo atraso na publicação de sexta-feira. Passei por problemas técnicos aqui no site e não pude subir o texto no dia combinado. Mas aqui está! Com atraso, mas no ar! E sim, a coluna continuará a ser publicada todas as quartas-feiras às 18h e as sextas-feiras às 19h (a não ser que ocorre algum problema técnico ou pessoal)

Sou viciada em séries com temáticas médicas desde os tempos da ER (1994). Aquele clima diferente de medicina norte-americana que parece que tudo é perfeito me encantou. Mas foi em House M.D. (2004) que vi a realidade da saúde nos Estados Unidos, que nem tudo é tão lindo como pinta o governo deles.

House nos mostra as confusões e problemas enfrentados no dia a dia por médicos e pacientes dentro de um hospital norte-americano… E depois dele, vieram muitas outras séries com teor médico que me encantaram e prenderam minha atenção. E agora, The Pitt surge como a nova queridinha tanto do público quanto da crítica especializada, provando que o gênero ainda tem muito a oferecer.

A fascinação duradoura pela medicina na TV

Os dramas médicos intrigam os roteiristas há muito tempo. A primeira série com a medicina como pano de fundo foi The Flying Doctor de 1959, uma produção do Reino Unido e Austrália, que foi uma adaptação de uma série de rádio homônima que ficou no ar até 1963. A série de TV ficou um ano no ar e no ano que findou a série de rádio se deu início a série/novela General Hospital, tirando a pioneira do ar. Desde então, o público não consegue resistir ao magnetismo dos hospitais na televisão.  A pioneira The Flying Doctor teve um remake, na própria Austrália, que ficou no ar de 1986 até 1992 e recebeu o nome de The Flying Doctors.

Primeira série médica da TV mundial: The Flying Doctor
Reprodução de vídeo do canal do Youtube @VintageFilmChannel

Lista das principais séries médicas ao longo das décadas (que eu assisti claro, existem muitas mais):
  • General Hospitalgênero classificado como novela (1963 e acredite se quiser, ainda está no ar)
  • Chicago Hope (1994 – 2000)
  • Mulherbrasileiríssima (1998 – 1999)
  • ER (1994 – 2009)
  • Nip/Tuck (1999 – 2010)
  • Scrubs (2001)
  • House M.D. (2004 – 2012)
  • Grey’s Anatomy (2005 – e resiste até hoje)
  • Private Practicespin-off de Grey’s Anatomy (2007 – 2013)
  • Three Rivers (2009)
  • Nurse Jackie (2009 – 2015)
  • Mercy (2009 – 2010)
  • HawthoRne (2009 – 2011)
  • Miami Medical (2010)
  • A Gifted Man (2011 – 2012)
  • Coma (2012)
  • Call the Midwifebritânica sobre parteiras (2012 e ainda no ar)
  • Perceptioncrime e drama médico juntos (2012 – 2015)
  • Saving Hope (2012 – 2017)
  • Do No Harm (2013)
  • The Night Shift (2014 – 2017)
  • Rush (2014)
  • The Knick – (2014 – 2015)
  • Code Black (2015 – 2020)
  • Chicago MED (2015 até hoje)
  • Unidade Básicabrasileira (2016 e ainda no ar)
  • Rosewood (2016)
  • Heartbeat (2016)
  • 9-1-1 – e todas as suas spin-offs – sobre paramédicos (2018 até hoje)
  • The Good Doctor (2017 – 2024)
  • New Amsterdam (2018 – 2023)
  • The Resident (2018 – 2023)
  • Station 19sobre paramédicos (2018 – 2024)
  • DOCoriginal italiana baseada em uma história real (2020 – ainda não foi cancelada oficialmente)
  • Transplant (2020 e ainda no ar)
  • Nurses (2020 – 2023)
  • Dr. Death (2021 – e nunca sabe se renova ou cancela)
  • Skymed (2022 e ainda no ar)
  • Sob Pressãobrasileira (2022 – 2024)
  • Sutura outra brazuca – minissérie (2024)
  • Doctor Odysseydrama médico à bordo de um cruzeiro de luxo (2024 – 2025)
  • DOC US (2025)
  • Pulse (2025)
  • Watsonna mesma pegada de House, mas com o Dr. Watson de Sherlock Holmes (2025)
  • E agora The Pitt (2025)

The Pitt: o fenômeno que conquistou os médicos da vida real

The Pitt chegou em 2025 como uma verdadeira revolução no gênero. A série da HBO Max, criada por R. Scott Gemmill (o mesmo de ER), protagonizada por Noah Wyle (que também participou de ER ainda jovem), tem sido elogiada até pelos médicos plantonistas do mundo inteiro pela quase total verossimilhança de suas cenas.

Eu estou hipnotizada por The Pitt, assim como fiquei com ER e House, e agora não consigo parar de assistir. A série se diferencia ao focar no ambiente de emergência de um hospital norte-americano, destacando a pressão sobre os profissionais, a falta de recursos e a crítica ao sistema de saúde com foco no lucro.

O realismo que impressionou até os profissionais de saúde:

O formato inovador da série, onde cada episódio representa uma hora específica de um plantão de 15 horas, mantém o espectador imerso no ritmo frenético de um pronto-socorro. Médicos emergencistas brasileiros, e do mundo inteiro, têm reagido positivamente à produção, destacando a fidelidade aos procedimentos e condutas médicas.

A Dra. Patrícia, médica emergencista entrevistada pelo site Medscape, explica: “Enquanto estamos fazendo um parto, chega outro paciente para intubar e ainda precisamos ajudar o residente a fazer uma cricotiroidotomia. De repente, um paciente tem derrame pericárdico e você precisa fazer uma pericardiectomia. São muitas coisas que acontecem em um plantão e é o que a série mostra.”

O realismo técnico que faz a diferença

The Pitt se destaca pelo rigor com a dinâmica interna do hospital e pela fidedignidade de condutas, medicamentos e procedimentos mostrados. Para criar a primeira temporada, foram contratados sete médicos emergencistas certificados: quatro para elaboração do roteiro e três consultores médicos no set de filmagem.

O uso do ultrassom à beira do leito, as condutas corretas em situações de assistolia e até mesmo técnicas alternativas de intubação são retratados com precisão técnica impressionante. Como destaca o Dr. Eduardo, emergencista da USP, em entrevista ao site MedScape: “É notável que a série foi feita por gente que conhece a realidade de um hospital.”

Brasil: nossa realidade médica nas telas

Por aqui, nossa cara é o SUS. É retratando a universalidade e, por vezes, a precariedade do maior sistema gratuito de saúde do mundo que as séries médicas do Brasil ganham dimensão.

Sob Pressão representa o mais bem acabado exemplo disso. A série brasileira, baseada no livro do cirurgião Marcio Maranhão, retrata as dores do Rio em vez das de uma metrópole norte-americana. Com abordagem documental, a produção filmou em um hospital real, o Hospital Nossa Senhora das Dores, localizado na zona norte carioca, em Cascadura, dando uma característica quase real aos episódios.

As diferenças entre sistemas de saúde:

E nem adianta comparar as séries norte-americanas com as brasileiras, afinal, nossa realidade médica é muito, muito diferente. A começar pelo atendimento do SUS, onde todo atendimento é gratuito. Já nos EUA, você será atendido, claro, mas depois virá a facada em forma de fatura para sua casa.

Nos Estados Unidos, uma viagem de ambulância custa entre US$ 400 e US$ 2.500, dependendo da região e gravidade da emergência. Tem gente que é atropelada na rua e prefere ir de metrô ou táxi do que entrar em uma ambulância. Nosso sistema de saúde tem seus problemas? Sim, claro! Mas nunca reclame do SUS, pois mesmo demorando o atendimento, faltando remédios e outras coisas mais, a gente simplesmente não paga nada por tudo isso.

Emmy 2025: The Pitt recebe reconhecimento merecido

The Pitt não apenas conquistou o público, mas também levou quase todos os prêmios do Emmy 2025. A série venceu nas categorias de Melhor Série Dramática, Melhor Fotografia e Melhor Direção em Série Dramática, consolidando sua importância no cenário atual. Sem falar que o brilhante Noah Wyle levou a estatueta como Melhor Ator Principal em Série de Drama e Katherine LaNasa agarrou o de Melhor Atriz Coadjuvante em Série de Drama.

Esse reconhecimento reflete a qualidade técnica e o impacto emocional que a série tem conseguido transmitir, provando que o gênero médico ainda tem muito a explorar quando feito com seriedade e competência.

Noah Wyle levou a estatueta como Melhor Ator Principal em Série de Drama e Katherine LaNasa agarrou o de Melhor Atriz Coadjuvante em Série de Drama / Foto reprodução Instagram oficial do Emmy




PODE CONTER SPOILER DA 1ª TEMPORADA DE THE PITT!!!





Por que ainda amamos séries médicas?

Curiosamente, o gênero só esfriou durante a pandemia, quando a audiência de programas com temas médicos caiu, afinal, nós estávamos ‘vivendo’ um drama médico na vida real e não queríamos ver nada sobre aquilo. Mas, segundo analistas da Parrot Analytics, a partir de meados de 2023, o gênero já voltou aos níveis pré-Covid.

As séries médicas funcionam porque combinam elementos universais: a luta entre a vida e a morte, dilemas éticos, pressão extrema e a humanidade por trás dos jalecos. Elas nos mostram heróis imperfeitos lidando com situações que testam não apenas suas habilidades técnicas, mas também sua resistência emocional. Afinal, médicos são humanos como todos nós, passíveis de falhas e falta de ética, como qualquer outro ser humano, e The Pitt tem demonstrado isso com uma delicadeza de detalhes incrível. 

Quando o Dr. Frank Langdon (Patrick Ball) é ‘dedurado’ por pela residente novata Dra. Santos (Isa Briones), em seu primeiro dia de trabalho, que é um viciado em analgésicos e está roubando os medicamentos dos pacientes no Episódio 10, da 1ª temporada de The Pitt, tudo vira de cabeça para baixo. Mas quando a gente acha que a história vai virar um clichê e o episódio ficará rodando sem sentido nessa trama, vemos que a realidade da emergência de um pronto-socorro vale mais que perder tempo discutindo com um médico viciado em drogas. 

A cena da discussão entre Langdon e Dr. Robby (Noah Wyle) escala no momento mais crítico do episódio (um tiroteio em massa em um festival de música que leva dezenas de pacientes críticos para o hospital). E o chefe do plantão não pensa duas vezes: demite Langdon. O enredo da descoberta do vício de Langdon até a revelação, com sua demissão, foi construído de forma subtil ao longo dos episódios iniciais.

Nada foi explícito, porque o foco de The Pitt sempre foi o dia a dia de um plantão e não o ‘drama pessoal‘ de cada profissional que lá trabalha. Isso fez com que a audiência da série subisse e fosse descobrindo o problema de cada um deles aos poucos e vendo que todos vivem entre a cruz e a espada, escolhendo sempre a vida dos pacientes ao invés de seus dramas pessoais.

Vemos isso na hora em que a enfermeira-chefe do plantão Dana (Katherine LaNasa) é agredida por um paciente irritado com a demora do atendimento. Por alguns momentos todos se preocupam com ela, mas depois que percebem que vai ficar ‘bem‘, a deixam de lado e vão cuidar do caos da emergência. E isso tudo leva ao final culminante na temporada onde Dana diz que está cansada de tudo aquilo e que vai ‘se aposentar‘ (será?).

Também tivemos a cena da crise de pânico do Dr Robby no chão da sala da pediatria que foi transformada em ‘necrotério temporário’ por conta do alto número de mortos no tiroteio. Ele, mesmo se mostrando um cara durão, capaz de suportar tudo, ao lidar com realidade de ter que informar (e mostrar) ao ex-enteado (que ele trata como filho) que a namorada dele morreu, Robby simplesmente desaba. 

O médico, que é judeu, não aguenta aquela pressão toda rolando do lado de fora, se escora na parede até cair sentado no chão e aos prantos começa a recitar o Shemá (oração judaica em hebraico). As primeiras palavras do Shemá são: “Ouve, ó Israel: o Senhor, nosso Deus, é o Único Senhor” (frase que ouvimos Robby recitar). Isso mostra o lado humano por trás do médico ‘frio’ e metódico apresentado durante toda temporada. Simplesmente, para mim, uma das melhores cenas de The Pitt

Dr. Robby em crise de pânico aos prantos recitando o Shemá – Reprodução HBO Max

Em todos esses momentos, vimos que, por mais que os médicos e demais profissionais de saúde tenham seus problemas pessoais, o pronto-socorro não pode parar. A emergência não tem tempo para dramas individuais quando a vida de um paciente está em jogo. E é por isso, que os verdadeiros profissionais de saúde estão gostando tanto da série, porque no dia a dia de um grande hospital com emergência é assim: o paciente vem primeiro, o seu problema por último. 

Tentaram muitas vezes fazer uma série de sucesso como ER e só conseguiram depois de anos de séries médicas fracassadas com modos exagerados de mostrar a medicina como um todo. Até que chegou The Pitt, que tem sido elogiada pela ‘quase’ total verossimilhança de suas cenas com o dia a dia real dos hospitais.

Apesar de eu assistir outras séries médicas que ainda estão no ar, nenhuma delas chega perto do caos realista de The Pitt. É uma mistura de ER com 24 (aquela série que cada episódio se passava durante um só dia) A série conseguiu traduzir a essência da especialidade médica de emergência, mostrando que quando o gênero é tratado com seriedade e conhecimento técnico, e o melhor: respeito, ainda consegue nos prender à tela e nos fazer refletir sobre a complexidade da vida e da medicina moderna.

De acordo com o site TVLine,  a 2ª temporada de The Pitt foi confirmada e as gravações começaram em junho de 2025 e a estreia está prevista para o dia 8 de janeiro de 2026, seguindo o formato de um evento anual para a série. The Pitt está disponível no streaming da HBO Max!

Related posts

“Minha Nova Ginecologista” estreia em outubro no Teatro Fashion Mall

“Flutuando” transforma crise climática em poesia cênica no Sesc Tijuca

Gilberto Gil anuncia datas de sua última turnê, Tempo Rei