Espetáculo “Hereditária” com Moira Braga

Hereditária

Hereditária, espetáculo idealizado pela artista Moira Braga, parte da descoberta aos 7 anos de idade de uma condição genética rara — Stargardt — que causaria a perda de sua visão, para investigar os múltiplos sentidos da hereditariedade, do genético ao social.

Contemplado no edital de cultura Pró-diversidade da Lei Paulo Gustavo, o espetáculo fará uma circulação por quatro regiões do Rio de Janeiro, nas Arenas Gilberto Gil, Jovelina Pérola Negra, Abelardo Barbosa Chacrinha e Fernando Torres. 

Há quase duas décadas atuando como autora, bailarina e atriz em espetáculos de dança, teatro e no audiovisual, esta é a primeira vez que Moira traz ao palco sua biografia, e tematiza a doença de Stargardt. “A ideia é dar uma resposta larga sobre de onde vem a doença”, explica Moira, “e abrir a reflexão para um leque mais amplo, investigando o que são nossas heranças e nossa hereditariedade, tudo que chega pra nós através da ancestralidade, tudo que fica pelo caminho, assim como as heranças que escolhemos ter”.

A dramaturgia, composta pela atriz junto com o diretor do espetáculo Pedro Sá Moraes, entrelaça eventos da vida pessoal e dos antepassados de Moira a referências históricas e mitológicas — como o mito grego das Moiras: três irmãs funestas que tecem o destino de todos os seres. Entre o biográfico, o poético e o político, Hereditária reflete sobre o quanto de nossas vidas é predeterminado e o quanto temos o poder de escolher. 

Mais do que acessibilidade, acesso

Para além de uma contrapartida social, a montagem de “Hereditária” tem a ampliação do acesso na raiz de sua concepção — o que é marca registrada dos trabalhos de Moira. No palco, a idealizadora contracena com duas outras atrizes, Luize  Mendes Dias, também intérprete de libras, e Isadora Medella, também multi-instrumentista. Libras e audiodescrição estão entrelaçadas de forma orgânica desde a dramaturgia até as movimentações de cena, expandindo as fronteiras do que costuma se compreender por “acessibilidade”. “Esse é naturalmente meu ponto de partida”, diz Moira, “quero que o meu trabalho acesse o maior número de pessoas e, por isso, fomos concebendo mecanismos estéticos e dramatúrgicos que proporcionem a expansão desse acesso”.

Um musical diferente 

A narrativa, atravessada por canções originais compostas por Sá Moraes, possui uma abordagem estética diferente do que costuma se entender por “Teatro Musical”.  A direção musical, assinada por Pedro junto com Isadora Medella, explora as vozes,  os corpos e até os objetos cênicos como instrumentos musicais. Nesta forma de fazer teatro, que recebe o nome de Teatrocanção “a musicalidade é o norte que ajuda a encontrar o tom da atuação, a pulsação de cada cena, mesmo quando não há nenhuma nota musical sendo tocada”, diz o diretor, indicado ao prêmio Shell em 2023 pela direção musical e canções originais do espetáculo “Em busca de Judith”.

O cenário é uma instalação visual e sonora do músico e artista plástico Ricardo Siri. É composto por objetos que, ao serem manipulados (pisados, percutidos, tocados, transportados) produzem os ambientes e sonoridades da peça. Para que pessoas cegas e de baixa visão tenham acesso a este cenário, serão convidadas a entrar no teatro alguns minutos antes da abertura de portas e explorar os objetos cênicos de forma táctil. 

Ao contrário dos musicais tradicionais, com números de dança virtuosísticos, a direção de movimento de Hereditária, assinada pelo performer, ator e professor da UFBA, Edu O. parte da diversidade de potências de cada corpo para compor gestos e movimentos cênicos. Edu, primeiro professor de dança cadeirante de uma universidade pública brasileira, é uma referência no debate sobre a deficiência nas artes, e traz sua reflexão a respeito do capacitismo, ou “bipedismo compulsório” para a criação de Hereditária.

Impacto social

O capacitismo é um conjunto de ações e perspectivas excludentes, que refletem de forma cotidiana uma realidade social bastante grave. Um levantamento do Ministério da Saúde revela que o Brasil possui, atualmente, 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência, representando 23,9% da população. Destas, quase 70% não concluíram o ensino fundamental e apenas 1% estão no mercado de trabalho. 

“Esta exclusão é uma espécie de herança: de desigualdades ancestrais, de preconceitos enraizados e solidificados em oportunidades que se abrem para alguns e fecham para outros. O projeto Hereditária nasce de um desejo de explorar, de forma criativa, poética, mas também política e lúcida, as diferentes dimensões das heranças que atravessam a vida do indivíduo com deficiência, e da sociedade como um todo”, explica a idealizadora do espetáculo.

Moira comenta ainda que existem boas políticas públicas para pessoas com deficiência, como o percentual mínimo de PCDs em produções artísticas, mas ela alerta sobre a falta de informação da população em geral: 

“O que precisamos agora é a ampliação do acesso à informação. Me choca a falta de conhecimento sobre o que estamos fazendo, o que é uma audiodescrição, como faz, porque é necessária. A gente precisa falar muito sobre isso. Precisamos que os patrocinadores se interessem, que o público queira conhecer”, afirma.  

Fafá e o reconhecimento nacional 

O trabalho de Moira Braga ganhou alcance nacional em 2022, quando participou da novela Todas as Flores, da TV Globo, como a personagem Fafá. “Comecei como preparadora de elenco, trabalhei com todos e acabei entrando para o elenco também”, diz. 

Em 2024 foi convidada novamente, para trabalhar na preparação de elenco da novela Renascer. “A novela Todas as Flores tinha a temática da deficiência, a mocinha da novela, interpretada pela Sophie Charlotte era deficiente visual, mas Renascer não tinha nada a ver com o tema da deficiência, então me chamaram de volta pelo meu trabalho e não pela temática”, pondera.

“Isso é muito importante pra gente, pessoas com deficiência, sermos chamadas não só para falar da deficiência. A gente quer trabalhar, fazer o que sabemos fazer”, finaliza a artista.

Buscando ampliar o acesso a este conhecimento e estas reflexões, o projeto Hereditária também prevê a realização de uma oficina para artistas e estudantes de artes cênicas e dança, com o foco na promoção de novas abordagens artísticas à acessibilidade.

FICHA TÉCNICA 

  • Idealização- Moira Braga
  • Dramaturgia – Moira Braga e Pedro Sá Moraes
  • Direção – Pedro Sá Moraes
  • Elenco –  Isadora Medella, Luize Mendes Dias, Moira Braga
  • Canções originais – Pedro Sá Moraes 
  • Direção musical – Pedro Sá Moraes e Isadora Medella
  • Direção de movimento – Edu O.
  • Cenografia- Ricardo Siri
  • Figurino – Vania Ms. Vee
  • Iluminação – Ana Luzia De Simoni
  • Identidade visual – Vinícius Santilli | Grambolart
  • Fotos – Junior Zagotto e Pedro Sá Moraes
  • Registro Audiovisual | Edição – 
  • Maquiagem- Lucia Carrara
  • Assessoria de Imprensa- Alessandra Costa
  • Consultoria em Libras – Jadson Abraão
  • Consultoria em audiodescrição –
  • Contabilidade – Davi Andrade 
  • Assistência de produção – Guilherme Soares
  • Direção de Produção – Jordana Korich
  • Realização – Grande Mãe Produções, Movimento Falado Ltda., Zingareio Produções Artísticas

SERVIÇO
Classificação Livre
Duração 60min
Todas as apresentações contam com acessibilidade  atitudinal ou comunicacional para pessoas com deficiência 

Circulação Arenas Culturais (Entrada Franca)

  • 12 de Setembro – Arena Abelardo Barbosa Chacrinha, às 15 horas

R. Sd. Elizeu Hipólito, s/n – Pedra de Guaratiba, Rio de Janeiro

  • 13 de Setembro – Arena Fernando Torres, às 15 horas

R. Bernardino de Andrade, 200 – Madureira, Rio de Janeiro

  • 19 de Setembro – Arena Gilberto Gil, às 14 horas

Av. Marechal Fontenelle 5000 – Realengo, Rio de Janeiro

  • 29 de Setembro – Arena Jovelina Pérola Negra, às 15 horas

Praça Ênio, s/n – Pavuna, Rio de Janeiro