A partir de 22 de julho, coletiva apresenta cerca de 50 obras de oito artistas mulheres de diversas etnias, de norte a sul do país
Instituição desenvolve um conjunto de ações indígenas permanentes pela defesa da vida e da riqueza cultural desses povos, contribuindo para a consolidação de seus direitos
A Escola de Artes Visuais (EAV) do Parque Lage abre para o público, em 22 de julho, a exposição ELAS Indígenas. Com curadoria de Alberto Saraiva, diretor da instituição, e do indigenista Toni Lotar, a mostra reúne cerca de 50 obras de oito artistas mulheres, de diversos povos indígenas de norte a sul do Brasil. A coletiva, que ocupa as Cavalariças do parque até 10 de setembro, apresenta a pluralidade do repertório poético das várias etnias representadas através de pinturas, objetos, intervenções e um painel de 50m².
As oito artistas selecionadas são empreendedoras que se colocam diante do conceito ocidental de arte a partir das referências de seus povos, tomando o controle de suas respectivas narrativas: Ana Kariri (Paraíba), Benilda Kadiwéu e Coletivo Kadiwéu (Mato Grosso do Sul), Juliana Guarany (Paraná), Mara Kambeba (Amazonas), Tapixi Guajajara (Maranhão), Vãngri Kaingáng (Rio Grande do Sul), Varin Marubo (Amazonas), We’e’ena Tikuna (Amazonas).
“Trata-se de uma incursão necessária para atualizar o Brasil de sua produção artístico-cultural, assim como demonstrar que os povos indígenas contribuíram efetivamente para construção de uma ideia de identidade nacional”, afirma Saraiva. “A luta dos povos originários pelo reconhecimento dos seus é uma das maiores da história do Brasil e todas as instituições devem estar unidas pela defesa da vida e da riqueza cultural desses povos, contribuindo para a consolidação de seus direitos”.
De acordo com o diretor, a EAV, em consonância com as ações do governo federal – que criou o Ministério dos Povos Indígenas, indicando lideranças com a devida representatividade para o órgão, e a Secretaria Especial de Saúde Indígena – está desenvolvendo um conjunto de iniciativas que a posicionam como uma escola mais indígena.
Além da exposição aqui apresentada, será somado ao programa de ensino da instituição o projeto Ações Indígenas Permanentes. A intenção é consolidar, ampliar e enriquecer a atuação da EAV, democratizando o acesso para todos os segmentos que compõem o povo brasileiro com sua rica mestiçagem populacional, cultural e espiritual, socializando a visibilidade artística dos indígenas.
Dentro dessa perspectiva, a EAV anuncia o primeiro curso de saberes indígenas em sua grade curricular, com a professora Varin Mema, do povo Marubo, do Vale do Javari. Doutora em Antropologia Social pela UFRJ/Museu Nacional, Varin passa a integrar o corpo docente da instituição, ministrando um curso sobre grafismos indígenas.
“Num momento em que a questão indígena avança em sua luta por respeito e dignidade dentro e fora do país, pensamos que essa exposição e a criação de cursos para aprendizagem dos saberes ancestrais é da maior importância na programação da escola. É fundamental a união de forças na preservação e difusão da riqueza cultural dos povos originários. E as mulheres indígenas têm protagonismo nesse contexto, pois se organizaram paulatinamente para tomar em suas mãos os seus próprios destinos, entrando definitivamente nas universidades, na política e nas artes”, reflete Alberto.
As artistas:
Ana Kariri (Paraíba)
Liderança da etnia Kariri da Paraíba, é artista visual indígena. Escritora, idealizadora e presidente do Coletivo Nacional Tuxaua, rede de saberes indígenas e cultura popular. É membra do Conselho de Cultura de Duque de Caxias e faz parte da rede nacional de escritoras indígenas do Mulherio de Letras.
Benilda Kadiwéu (Mato Grosso do Sul)
Benilda Vergílio é indígena da etnia Kadiwéu, da aldeia Alves de Barros, localizada no município de Porto Murtinho, Mato Grosso do Sul. Entre o povo Kadiwéu, é chamada de Beni ou “Examelexe”, que é uma cantoria em homenagem aos indígenas cavaleiros “Ejiwajegi”, que lutaram na guerra do Paraguai contra o Brasil.
Desde 2009, tem usado o etnodesign para mostrar aspectos da cultura Kadiwéu ao mundo, através das vestimentas. Suas coleções revelam detalhes, grafismos e cores que remetem aos rituais e festividades de seu povo.
Além de ativista pelos direitos dos povos indígenas, Benilda é defensora e propagadora da arte Kadiwéu, sobretudo da cerâmica Kadiwéu, principal fonte de renda das mulheres de seu povo. Participou de eventos, abordando a importância da preservação e valorização da arte Kadiwéu. Suas coleções trazem peças exclusivas, que remetem às cores da cerâmica Kadiwéu, à relação com o meio ambiente e aos aspectos históricos de sua cultura. Provoca a reflexão sobre o universo simbólico da arte Kadiwéu, repleto de significados e elementos muito relevantes para a cultura desse povo.
Juliana Guarany (Paraná)
“Meu nome é Juliana Yva Mirim da Silva, nasci na aldeia Mbyá Guarani, de Palmeirinha no Paraná. Atualmente moro na Aldeia Mata Verde Bonita, em Maricá. Sou pintora desde meus 14 anos. Faço parte da organização feminina da comunidade de minha aldeia.”
Mara Kambeba (Amazonas)
“Meu nome é Mara Kambeba e é como me chamam nacionalmente no movimento indígena (nome civil Jacimar de Almeida Gouvêa). Sou graduada como assistente social. Meu povo é originário do Alto Solimões do Amazonas, do município de São Paulo de Olivença. Somos conhecidos como o povo Omágua (povo das águas), proveniente do Peru. Em Manaus, fiz parte do MEIAM – movimento estudantil indígena do Amazonas, onde fui vice coordenadora; depois fui da COIAB – Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia; tornei-me membra do CONAME – Conselho Nacional da Mulher Indígena; em 2004 fiz parte do CNDM – Conselho Nacional do Direito da Mulher pela presidência da república, representando as mulheres indígenas do Brasil. Foi nessa gestão que lutamos pelo empoderamento das mulheres: 30% do fundo partidário para as mulheres e do plano nacional dos direitos das mulheres. Sou artista, pinto, desenho, faço bonecas indígenas articuladas e faço moda indígena.”
Tapixi Guajajara (Maranhão)
“Sou Tapixi Guajajara, Tapixi (significa coelho) Guajajara (significa “donos do cocar”). Meu nome civil é Iranelza Bernardo Gragório Guajajara. Meu povo é proveniente do Maranhão, conhecido como Tenetehara (somos os seres humanos verdadeiros). Eu sou da Aldeia Buritizal, nossa língua é o ze’egete, que significa “a fala boa”. Sou pintora, canto e desenho grafismos em vários objetos como o maracá. Vou fazer um convite em minha língua para que venham para nossa exposição: “Pedura aicé tekowa mêê maá diapó pirera rétchakapó” (tradução: “Gente, vem conhecer o trabalho do povo Guajajara”).”
Vãngri Kaingáng (Rio Grande do Sul)
Vãngri nasceu na terra indígena Ligeiro, no Rio Grande do Sul. Ajudou a retomar a Aldeia de Alto Recreio Serrinha, onde mora desde então (abril de 2000). A aldeia localiza-se ao norte do Rio Grande do Sul, sendo sede do Ponto de Cultura Kanhgág Jãre, que trabalha a educação, saúde e cultura dentro das terras indígenas Kaingáng.
Escritora e artista plástica desde 2005, trabalhou em muitos projetos culturais, dentro e fora das Aldeias e do estado, assim como no Ponto de Cultura Kanhgág Jãre. Educadora e coringa do Teatro do Oprimido de Augusto Boal, trabalhou teatro na comunidade de Serrinha, entre o povo Kaingáng, e em aldeias de outros povos indígenas pelo Brasil.
É Griô, mestre de tradição Kaingáng, especialista em comida tradicional, música, canto e dança. Vãngri também é contadora de histórias das mitologias da criação do povo Kaingáng, e cultiva e realiza trabalhos com remédios e ervas tradicionais de seu povo.
Varin Marubo (Amazonas)
“Meu nome (minha família me chama de) é Varin Mema (o nome civil é Nelly Barbosa Duarte Dollis). Meu povo é denominado como Marubo (nós nos autodenominamos de Yôra ou Yôrarasĩ, que significa ‘gente/corpo’; yôra é matéria completa, com suas maneiras de ser, surgimento de origens, conhecimentos; rasῖ é morfema plural).
Sou oriunda da terra indígena Vale do Javari, localizada no oeste do Amazonas, tríplice fronteira com o Acre, Amazonas e Peru. Na TI o povo Marubo vive em duas calhas dos rios Ituí e Curuçá.
Atualmente sou doutora em antropologia Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro/Museu Nacional, pelo programa de pós-Graduação em Antropologia Social. Estou cursando Especialização em Direito Público na UFAM/Manaus. Sou Bacharel em Antropologia Social na Universidade Federal do Amazonas, no ano de 2008/2014, na cidade de Benjamin Constant/AM, e fiz mestrado em Antropologia Social na UFRJ/MN 2015/2017. Trabalho na Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB, no Setor da Gerência de Povos Indígenas Isolados e de Recente Contado – GPIIRC, como técnica de projetos.”
We’e’ena Tikuna (Amazonas)
We’e’ena é proveniente da terra indígena de Umariaçu, no Alto Solimões, no Amazonas do povo Tikuna. Seu nome significa “a onça que nada para o outro lado do rio”. Um nome sugestivo para uma mulher indígena que se tornou protagonista na representatividade de seu povo. We’e’ena é artista plástica, palestrante, cantora e designer de moda. Tornou-se ativista dos direitos indígenas, utilizando as redes sociais para falar de arte, cultura e saberes dos povos originários.
SERVIÇO:
ELAS Indígenas
De 22 de julho a 10 de setembro de 2023
Local: Cavalariças | Escola de Artes Visuais do Parque Lage
Endereço: Rua Jardim Botânico, 414
Rio de Janeiro | RJ
Tel: (21) 2216-8505
Visitação: de quinta a terça, das 10h às 17h (a exposição não abre às quartas). Não é necessário agendamento prévio.
Gratuito | Aberto ao público
Classificação livre
Website: http://eavparquelage.rj.gov.br/
Instagram: @parquelage