Lugar de estar: o legado Burle Marx

por Redação
Roberto Burle Marx, Praça 15 de novembro_ Terreiro de Jesus, 1952, guache sobre cartão _ 58,4 x 101 cm – foto Rafael Adorján - Acervo Instituto Burle Marx

Instituto Burle Marx e MAM Rio renovam olhar sobre o legado do paisagista com exposição inédita que discute temas contemporâneos a partir de 22 projetos

João Modé, Luiz Zerbini, Maria Laet, Mario Lopes, Rosana Paulino e Yacunã Tuxá foram convidados a pensar questões sugeridas pelo trabalho de Burle Marx

O Instituto Burle Marx e o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio) anunciam a exposição Lugar de estar: o legado Burle Marx, que será inaugurada em 27 de janeiro de 2024. A curadoria conjunta de Beatriz Lemos, curadora-chefe do MAM Rio, Isabela Ono, diretora-executiva do Instituto Burle Marx, e Pablo Lafuente, diretor artístico do museu carioca, propõe novas leituras sobre o acervo documental do trabalho de Roberto Burle Marx (1909-1994) e de seus colaboradores, no escritório onde foram concebidos mais de 2 mil projetos paisagísticos entre os anos 1930 e 1990.

“Organizamos uma exposição que parte do trabalho do Escritório Burle Marx e nos incita a pensar questões que afetam o presente e futuro de nossas cidades e dos espaços que compartilhamos”, informa Pablo Lafuente. O direito à cidade, o ativismo ambiental, a sociabilidade nos espaços públicos e as espécies botânicas como patrimônio são temas abarcados pelo legado Burle Marx a partir da década de 1930, que emergem do acervo salvaguardado pelo Instituto desde a sua criação, em 2019.

“São sete décadas de contribuição para a sociedade, discutindo sobre as cidades, a relação entre seres humanos e natureza, a importância dos espaços democráticos de convívio social e bem viver”, afirma Isabela Ono.

Segundo Beatriz Lemos, a exposição propõe um olhar contemporâneo “que tem no Parque do Flamengo o mote conceitual que nos leva a outros projetos no Rio de Janeiro, no Brasil e no exterior. Nos interessa pensar como esses espaços foram ressignificados ao longo do tempo”.

Paisagista, artista multifacetado e nome incontornável do modernismo brasileiro, Roberto Burle Marx foi autor do projeto dos jardins do MAM Rio, instituição na qual acontece a terceira exposição do Instituto. Para ampliar o diálogo sobre o acervo, composto por cerca de 150 mil itens, o discurso curatorial partiu dos temas que surgem de 22 projetos do paisagista e sua equipe. 

Em mil metros quadrados de área expositiva, a narrativa se constrói a partir de projetos que pensavam cidades, estudos, croquis, desenhos, fotografias e recortes de jornal somados às obras dos artistas convidados: João Modé, Luiz Zerbini, Maria Laet, Mario Lopes, Rosana Paulino e Yacunã Tuxá. Os seis foram instigados a reverberar o legado Burle Marx por meio de trabalhos produzidos especialmente para a mostra ou já existentes. 

“A ideia é que esses artistas nos ajudem a explorar temáticas levantadas a partir do diálogo com o acervo”, comenta Lemos. A curadoria destaca a relevância de reunir um grupo de gerações, origens e práticas distintas. “É uma amostra dos diferentes caminhos que a obra de Burle Marx faz possíveis”, sintetiza Pablo Lafuente.

Lugar de estar: o legado Burle Marx reúne cerca de 100 itens, em uma expografia que remete aos “lugares de estar” criados como espaços públicos pelo paisagista e seus colaboradores, com áreas de contemplação, encontro, experimentação e simplesmente de estar. A mostra conta também com entrevistas em vídeo – algumas do acervo e outras gravadas para a ocasião, com depoimentos dos colaboradores sobre a experiência de trabalho no Escritório. 

Usar a memória oral na exposição foi uma forma de destacar o caráter coletivo e colaborativo do legado Burle Marx, segundo Isabela: “Ao longo de sua história, o Escritório Burle Marx teve o compromisso ético-estético de pensar a coletividade ao construir esses espaços públicos e democráticos. Do croqui ao projeto, até o jardim executado, refletem um desejo de utopias de cidades mais verdes e plurais”.

Um parque dentro do museu

O Parque do Flamengo, onde está localizado o edifício do MAM Rio, é o ponto de partida que inspirou a exploração de outros projetos que foram idealizados no Brasil, para os estados do Rio de Janeiro, Paraíba, Bahia, Pernambuco, São Paulo e Brasília; e na Venezuela, na cidade de Caracas. 

Em relação ao Rio, a exposição questiona o direito à cidade ao evidenciar que a maior parte dos projetos não executados, como o Parque Moça Bonita, em Bangu, ou parcialmente executados, como o Parque da Maré, às margens da Avenida Brasil, estavam fora do eixo  zona sul, área nobre da cidade.

Para Isabela Ono, falar sobre projetos concebidos para outros territórios têm relevância do ponto de vista curatorial: “É importante refletir sobre esses espaços de acesso coletivo nas cidades, e pensar o que determinou as escolhas e execução a partir de determinados contextos históricos e localização. E como, neste processo de construção de cidades, alguns jardins continuam vivos, enquanto outros nem saíram do papel ou foram abandonados”.

O Parque do Flamengo é um referencial para pensar a ideia de construção do Rio de Janeiro e refletir sobre quem usufrui das áreas públicas. “A exposição fala do direito à cidade a partir também dessas escolhas de projetos executados e não executados, indicando o porquê disso, quais os critérios e os contextos dessas escolhas”, afirma Beatriz Lemos. 

Em diálogo com esse tema, está a obra comissionada de Mario Lopes, artista e coreógrafo paulistano que se define como uma presença afrotranstópica. Desde 2009, trabalha como articulador cultural com foco na promoção e circulação de obras e projetos que buscam transformações sociais. Para a exposição Lugar de estar, produziu sete vídeos com performances de dança, em colaboração com outros bailarinos, captadas em espaços concebidos por Burle Marx e seus colaboradores na cidade do Rio de Janeiro, como Largo da Carioca, Praia de Copacabana e Parque da Maré

A artista e ativista indígena Yacunã Tuxá, de Rodelas, sertão da Bahia, trabalha com a criação de figuras indígenas, principalmente mulheres, em diversos contextos de trabalho, localidade e relações, e recebeu o convite para pensar uma obra a partir do legado de Burle Marx e a paisagem construída do Parque do Flamengo. Em uma pintura com galhos e peças em cerâmica, a artista aborda os processos de enraizamento e semeadura, e recria seu bioma de origem, a caatinga brasileira, para refletir sobre os lugares de lazer que nos acolhem. 

Sua obra faz uma ponte com as viagens de pesquisa (excursões) realizadas nos biomas nacionais por Burle Marx e colaboradores, que tinham como objetivo estudar as paisagens naturais brasileiras, atentos às espécies vegetais nativas com potencial ornamental, que se tornariam elementos para construção de novas paisagens através de seus projetos.

Os espaços públicos vão ser discutidos a partir dos seus usos como lugares de encontro, lazer e fruição estética, além da sua preservação como patrimônio. “A mostra traz uma perspectiva física e simbólica desses espaços, e reflete sobre o que representam e como são ressignificados ao longo do tempo”, analisa Beatriz. 

Três obras da carioca Maria Laet abordam o encontro da artista com o jardim do MAM Rio. Um díptico de vídeos, uma instalação e fotografias dialogam com o Jardim de Pedras, partindo de composições geométricas e abstratas, semelhantes àquelas encontradas nos projetos paisagísticos de Burle Marx. Nos vídeos, Laet constrói uma conversa com as pedras e elásticos, explorando gestos manuais de negociações e limites. Na instalação, as pequenas rochas surgem reposicionadas em folhas de papel e desenhos, sobre uma mesa. Por fim, o registro de uma ação realizada no jardim, em frente ao museu, em que a artista literalmente costura a terra para criar uma conversa poética.

O Projeto Moderno, que alia a arquitetura ao paisagismo, é explorado através de projetos como o do MAM, no Flamengo; do Palácio Capanema, antigo Ministério da Educação e Saúde, no Centro; do Complexo Pedregulho, em São Cristóvão; e da Praça do Teatro Armando Gonzaga, em Marechal Hermes. 

“Esses projetos consideravam o espaço externo também como conceito de arquitetura. A partir dessas obras históricas, podemos refletir sobre a proposta de construção de um país moderno e a ressignificação desse pensamento para inspirar a construção de novas cidades, mais plurais, verdes e democráticas”, reflete Beatriz. E Isabela destaca: “Fica muito claro nesses projetos a generosidade daquela geração modernista de criar espaços onde a relação externa e interna se equaciona de forma potente, complementar e harmônica“.

Essa relação entre espaço interno e externo é evidenciada pelo artista carioca João Modé, na instalação “Land”, que constrói uma pequena floresta dentro do museu. Instaurado no foyer, o trabalho dialoga com a área externa do edifício e propõe uma associação entre arquitetura e plantas, convidando o público à interatividade.

O legado Burle Marx na botânica também é celebrado, com registros que documentam as viagens de pesquisa feitas pelo paisagista e sua equipe pelo Brasil, com o intuito de conhecer novas paisagens, valorizar biomas e coletar espécies para seus jardins. Essas excursões contribuíram para a ciência ao promover a catalogação de mais de 50 espécies não registradas à época, e ao identificar plantas em risco de extinção. Dialogam com esse inventário de espécies os artistas Rosana Paulino, com obras de 2019, e Luiz Zerbini, com uma nova série de monotipias.

Os desenhos da série Senhoras das plantas (2019), da artista visual paulistana Rosana Paulino, retratam corpos femininos entrelaçados com raízes e plantas. Para Beatriz Lemos, essas senhoras-plantas revelam a relação entre seres humanos e a vida vegetal, através da dimensão interespécie: “A presença da obra de Rosana nos ajuda a compor imagens em que os vínculos entre humanos e plantas não passam pelo crivo da hierarquia ou exploração, mas sim da troca”. 

Luiz Zerbini foi convidado para o diálogo com o legado a partir de seu trabalho com monotipias criadas com plantas e árvores. As gravuras e suas matrizes vegetais trazem detalhes, texturas, cores e a materialidade de espécies vegetais coletadas pelo próprio artista durante uma visita ao Sítio Burle Marx.

Por fim, um painel mostra o ativismo de Burle Marx acerca das questões ambientais e climáticas. “Nos anos 60 ele já falava sobre a crise climática. Era uma voz pública, engajada e crítica numa época em que não se falava muito sobre o assunto”, afirma Pablo Lafuente. Isabela Ono relembra o posicionamento de Burle Marx, inclusive registrado nos jornais da época e nas suas participações no Conselho Nacional de Cultura, principalmente entre os anos 1960 e 1970, em que enfatiza os danos do “dito” progresso nacional da abertura das rodovias Rio-Santos e Transamazônica, em plena ditadura militar, já em tom de denúncia e alerta.

As questões ambientais ganham atenção especial por parte do MAM Rio, que abre o ano de 2024 comprometido com a sustentabilidade por meio de seu programa e das próprias dinâmicas de trabalho. “Nesse sentido, a exposição reflete nosso interesse em pensar essas questões e faz parte de uma série de ações que o museu adotará ao longo dos próximos meses e anos”, adianta Lafuente.

Lei de Incentivo à Cultura

  • Organização da exposição: Instituto Burle Marx e Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro
  • Patrocínio Master da Exposição: Repsol Sinopec Brasil
  • Patrocínio Estratégico MAM Rio: Instituto Cultural Vale, Ternium, Petrobras
  • Realização: Ministério da Cultura

MAM Rio

A partir do tripé arte-cultura-educação, o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro trabalha com a preservação, desenvolvimento e compartilhamento de práticas de criação e pensamento. O MAM Rio tem como patrocinadores estratégicos o Instituto Cultural Vale e a Ternium através da Lei Federal de Incentivo à Cultura e a Petrobras através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura do Rio de Janeiro. 

Desde a sua fundação em 1948, atua como um importante agente, contribuindo com a movimentação social dos territórios da cidade por meio da cultura. Bem como promove a criação artística e cultural como processo de formação de indivíduos e coletivos. O acervo de cerca de 16 mil obras é uma das mais relevantes coleções de arte moderna e contemporânea da América Latina. 

O MAM Rio realizou exposições que marcam as expressões e linguagens das artes visuais até os dias de hoje, tendo abrigado desde sua criação importantes cenas artísticas brasileiras, como o Cinema Novo e o neoconcretismo.

O MAM Rio também conta com patrocínio da Mattos Filho Advogados, BMA Advogados, Redecard, Sergio Bermudes Advogados, Gávea Investimentos, Eneva e Granado através da Lei Federal de Incentivo à Cultura; Vivo, BAT Brasil e Léo Social através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura – Lei do ICMS RJ; Adam Capital, Concremat, Deloitte, Globo, Guelt Investimentos, Icatu, JSL, Multiterminais e XP Inc., através da Lei Municipal de Incentivo à Cultura – Lei do ISS RJ; e Samambaia.org.

Instituto Burle Marx

Preservar, ressignificar e difundir o legado vivo do paisagista e multiartista Burle Marx e de seus colaboradores. Esta é a prioridade do Instituto Burle Marx, uma organização da sociedade civil criada em 2019 com a missão de promover cidades mais verdes, sustentáveis, inclusivas e acolhedoras, incentivar o bem-viver em ambientes públicos e privados, favorecer o encontro entre as pessoas e elementos naturais e propiciar o acesso ao paisagismo como fazer artístico a serviço da sociedade.

O Instituto nasce do desejo dos sócios do escritório de transformar o seu acervo, que é privado, em acervo de interesse público, acessível à sociedade e tem como inspiração um rico acervo que reúne mais de 150 mil itens entre projetos urbanísticos, estudos, croquis, desenhos, fotografias, recortes de jornal, cartas e documentos que foi cuidadosamente preservado ao longo de quase sete décadas de atuação de um dos maiores artistas brasileiros do século 20.

Em 2021, o Instituto realizou a sua primeira exposição, O tempo completa: Burle Marx clássicos e inéditos, na Casa Roberto Marinho, em que apresentou os tesouros de seu acervo ao público carioca. Em 2022, a mostra Paisagem construída: São Paulo e Burle Marx aconteceu no Centro Cultural Fiesp e explorou a construção de paisagens e natureza na capital paulista. Atualmente, o Instituto desenvolve um minucioso trabalho de preservação, levantamento, catalogação e digitalização deste material – envolvendo uma equipe interdisciplinar formada por museólogos, arquivistas, historiadores, arquitetos e consultores em diferentes áreas. Além de ações de difusão e valorização do legado coletivo, como exposições, publicações, pesquisas e futura disponibilização do seu acervo no site e redes sociais.

A exposição tem o patrocínio master estratégico da Repsol Sinopec Brasil. O Instituto Burle Marx também conta com o apoio do Vieira Rezende Advogados, Mansur Murad, Tátil Design, Escritório de Paisagismo Burle Marx, BrazilFoundation, Leon Levy Foundation; apoio técnico do Instituto Moreira Salles, além do Instituto Cultural Vale através da Lei de Incentivo à Cultura para digitalização de parte do acervo.

SERVIÇO:

LUGAR DE ESTAR: O LEGADO BURLE MARX
Curadoria: Pablo Lafuente, Isabela Ono e Beatriz Lemos
Abertura: 27 de janeiro de 2024
Encerramento: 26 de maio de 2024

MAM Rio

  • End: av. Infante Dom Henrique, 85
  • Aterro do Flamengo – Rio de Janeiro
  • Tel: (21) 3883-5600
  • https://www.mam.rio/
  • Instagram: @mam.rio

Instituto Burle Marx

  • https://www.institutoburlemarx.org
  • Instagram: @institutoburlemarx

Horários:

  • De quarta a domingo (incluindo feriados), das 10h às 18h
  • Aos domingos, das 10h às 11h, visitação exclusiva para pessoas com deficiência intelectual

Ingressos:

Contribuição sugerida, com opção de acesso gratuito
Valores sugeridos:
Adultos: R$ 20
Crianças, estudantes e +60: R$ 10
Ingressos on-line: www.mam.rio/ingressos

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