O poeta, professor e filósofo Caio Lucílio e a poeta e escritora Marcela Oseas Ferreira, fundadores do projeto Poesiar, foram convidados para um intercâmbio literário em Portugal, em abril, com jovens de mais de 25 nacionalidades. Mas, sem apoio cultural, os moradores de São José (SC), na Grande Florianópolis, tiveram de arcar sozinhos com o custo das passagens e da alimentação, num total de R$ 17.000,00. Mesmo o Poesiar tendo sido aprovado pela Rouanet (Lei Federal de Incentivo à Cultura), eles enfrentam a dura realidade da dificuldade de captação. O valor arrecadado que, para eles, é bem significativo, para grandes empresas pode ser até simbólico. Os brasileiros receberam apoio apenas das escolas e dos professores portugueses para estadia e parte da alimentação, mas faltou recurso para passagens e demais despesas.
Caio destaca que a burocracia e a falta de engajamento de empresas com a cultura tornam o caminho bastante árduo. “Mesmo sem apoio financeiro, decidimos ir, porque mais do que um projeto social, encaramos isso como uma missão: levar a leitura aos jovens, despertar neles a paixão pela poesia, incentivar a expressividade e criar espaços vivos de troca e cultura. Acreditamos no poder da palavra como ferramenta de transformação e seguimos com ela, mesmo quando o apoio nos falta”, desabafa Caio.

Registro feito em Penafiel, junto com professores e escritores portugueses. Foto: Divulgação
Já em além-mar, os brasileiros participaram de atividades na Escola Secundária de Penafiel, na cidade de Penafiel, e na Escola Básica e Secundária de Machico, na Ilha da Madeira, junto com escritores portugueses, para cerca de 500 estudantes, fora a equipe gestora e professores. Em Penafiel, vivenciaram uma grande programação, primeiro na forma de workshop de escrita poética com os alunos. No segundo momento, participaram de um painel ao lado dos autores portugueses José Miguel Gomes, Cidália Fernandes e Norberto Valério, mediado pelos alunos.
Um terceiro momento foi regido pelos alunos, onde se expressaram de diversos modos, através da dança, da música e da declamação de poemas. Já na Ilha da Madeira, os poetas realizaram uma oficina de escrita criativa com os alunos, junto aos escritores portugueses Luís da Costa e Magda Franco.
“Não foi fácil. Enfrentamos silêncios que doem mais que um ‘não’ dito em voz alta! Vimos portas se fecharem onde havia chance de apoio. Ainda assim, seguimos. Nós seguimos porque, para mim, a literatura nunca foi um luxo, ela é necessidade, é cura, ar. Eu acredito que cada jovem que se encontra com um poema pode, de algum modo, se encontrar também consigo mesmo. E isso muda tudo. Nosso trabalho não se limita à escrita. Incentivar a leitura, abrir espaços para a poesia, criar territórios de expressão, tudo isso exige muita coragem. E, mais do que isso, exige muito amor. Amor pela palavra, pela arte, pelas pessoas. Mesmo quando os recursos faltam, o que não falta é essa chama dentro de nós. É ela que nos faz continuar”, destaca Marcela.
Protesto silencioso por falta de apoio
Como protesto silencioso, os poetas viajaram vestindo camisetas com os dizeres, em português e inglês: “A poesia é nossa força, nosso combustível. Estamos viajando sem apoio e patrocínio! Cultura não é favor, é direito de todos. O projeto está sem verba, mas repleto de versos que atravessam fronteiras!”.
Professoras portuguesas destacam importância da participação dos brasileiros
Carla Ribeiro, professora de Português e Literatura da Escola Básica e Secundária de Machico, na Ilha da Madeira, salienta que a visita dos poetas brasileiros Caio e Marcela à escola foi uma experiência enriquecedora para toda a comunidade educativa. “A oportunidade de partilharmos a nossa realidade escolar com estes autores, oriundos de outra cultura e contexto educativo, proporcionou momentos de grande aprendizagem e reflexão. A Oficina de Escrita, dinamizada em conjunto com outros dois escritores e dirigida aos alunos do ensino secundário, revelou-se um espaço privilegiado de expressão criativa, diálogo intercultural e descoberta da palavra como instrumento de transformação. A presença destes poetas contribuiu para alargar horizontes, inspirar jovens talentos e reforçar a importância da literatura como ponte entre mundos. Uma iniciativa a repetir, sem dúvida, pelo seu valor humano, pedagógico e artístico”, destaca Carla.
Para Maria Eulália Ferraz Barbosa, professora de Português e Literatura da Escola Secundária de Penafiel, foi um evento riquíssimo que reuniu muitos elementos da comunidade escolar. “Os alunos deram voz à poesia, juntamente com os autores convidados [os brasileiros Caio Lucílio e Marcela Ferreira, e os portugueses José Miguel Gomes, Norberto Valério e Cidália Fernandes]. Esta atividade, que percorreu várias vertentes artísticas, proporcionou ao público uma experiência rica e envolvente e promoveu diálogos e reflexões emergentes”, conta. “Ouviram-se e sentiram-se as emoções das palavras, valorizando-se, assim, ainda mais a poesia”, completa Maria Eulália.