Nossas Sensações Não São Nossas

Exposição estreia dia 17/3 no MIS-RJ e promoverá um encontro entre arte contemporânea, música e carnaval através dos tempos, exaltando a arte negra

por Jorge Rodrigues

Nossas Sensações Não São NossasHá pessoas, costumes, estéticas e sons que ecoaram antes de nós, muitas vezes por figuras que foram amplamente perseguidas e criminalizadas, e que propuseram questões e modos de brincar que ainda podem ser identificados e, principalmente, ouvidos hoje. Entre 17 de março e 5 de maio de 2023, o Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro vai receber a exposição: “Nossas Sensações Não São Nossas”, que explora a relação entre arte contemporânea, música e o carnaval através dos tempos.

A exposição é gratuita e será inaugurada no dia 17/3, das 17h às 19h30. Estará aberta à visitação de segunda a sexta, das 10h às 17h, no MIS-RJ: Rua Visconde de Maranguape 15, Lapa. Próximo aos Arcos da Lapa, ao lado do Hotel Selina. A mostra também terá uma ação educativa com bate-papos sobre os temas da exposição, tais como “Papel dos museus e seus acervos hoje”, “Expressões de carnaval e arte”, “Balanço do carnaval: cidade e economia” e “Carnaval entre histórias e religiões”. A programação das mesas ainda será confirmada. Alguns convidados já confirmaram, são eles: Thayná Trindade (pesquisadora e curadora assistente do Museu de Arte do Rio), Anna Luísa Oliveira (coordenadora de educação do Galpão Bela Maré do Observatório das Favelas) e o artista Mulambö.

Com curadoria de Ana Paula Rocha, a mostra é composta por itens do acervo do MIS, além de obras de expoentes da nova cena contemporânea. Jefferson Medeiros apresentará o trabalho inédito “Viramundo”, assim como Lucas Almeida, que apresenta obra inédita sem título, concebida para a exposição. Ramo apresentará a série “Ausar” e duas telas inéditas, “Sete Coroas” e “Kushita”. Os artistas André VargasMulambö Uberê Guelé também terão obras não-inéditas na mostra. O fotógrafo Guga Ferreira vai expor fotos inéditas da série Ponto Riscado clicadas em festas de terreiros da Zona Oeste do Rio de Janeiro de religiões de matriz africana.

Entre os destaques do acervo do MIS, estarão expostas memórias das produções de João da Baiana e Heitor dos Prazeres, além de fotos e artigos que remontam ao carnaval e à Rádio Nacional, especialmente de artistas como Clementina de JesusElizeth CardosoPixinguinha, Sinhô, Ismael Silva, Aracy de Almeida, Orlando Silva e  Zé Keti. Apesar dos tempos anacrônicos, o que essas obras têm em comum? Todas trazem reflexões e aspectos a respeito dos carnavais de seu tempo, muitas vezes invisibilizados por artistas brancos com maior projeção midiática, outras vezes ditando novos padrões sonoros e estéticos que bebem de fontes e experiências vividas comuns: a rua, a festa, a boemia, o sofrer racismo e a perseguição policial.

“Os artistas que reverenciamos na exposição como Heitor dos Prazeres, Clementina de Jesus, Aracy de Almeida, Sinhô e o grupo Os Oito Batutas integrado por Pixinguinha, por exemplo, são homens e mulheres, todos negros, que tiveram a coragem de criar arte, fazer carnaval, e de levar reflexões e felicidade para um Brasil extremamente racista e hostil. Muitas vezes, eles foram perseguidos por isso, evidenciando não só alegrias, mas práticas de exclusão em suas músicas. Já os artistas de hoje vêm para dialogar com essas obras, demonstrando muitas vezes ressonância entre essa produção e as suas próprias, fazem ecoar imagens, sons e a mesma luta nos tempos atuais”, afirma Ana Paula Rocha, curadora.

O carnaval como uma festa e expressão popular oriunda da população negra, bem como a influência das religiões de matriz africana que perpassam as obras e a produção intelectual e estética dos artistas históricos, estarão presentes em Nossas Sensações Não São Nossas, que também resgata a memória das sonoridades carnavalescas, que ecoam pelas ruas da cidade do Rio de Janeiro até os dias de hoje e que têm, com as transmissões do rádio e seus personagens, uma indiscutível relação.

“A relação entre arte contemporânea, música e carnaval é algo que vem sendo paulatinamente consolidado. Também entre os novos artistas, a temática da festa de rua, seja o próprio carnaval, passando pelas folias, o maracatu ou os bailes funk, ganha uma relevância nas formas como eles vêm se expressando. Assim, é inevitável unir essas temporalidades”, explica a curadora, que desenvolveu sua pesquisa de mestrado sobre o carnaval de rua, atualmente pesquisa arte contemporânea e tecnologia, além de já ter atuado no acervo da Discoteca do MIS.

A exposição é um dos projetos contemplados no edital EXPOMIS – Cultura, Educação e Memória, primeiro edital de fomento promovido pela Fundação Museu da Imagem e do Som.

Obras do passado buscam inspirar e dialogar com o presente

A mostra começa no Rio de Janeiro do início do século XX, período cerca de vinte anos após a abolição do trabalho escravo no Brasil. Em termos de artes visuais, os artistas negros do período foram (e são) frequentemente nichados como “populares”, “primitivos” ou “naifs”. É o caso de Heitor dos Prazeres (1898-1966). Artista revisitado por literatos como Rubem Braga e Carlos Drummond de Andrade, integrou exposições relevantes em espaços como o Museu de Arte Moderna (1961) e o 1º Festival de Arte Negra de Dakar (1966).

Além dele, João da Baiana (1897-1974), seu parceiro de infância e profissão, com atuação na Orquestra Brasileira do programa Um Milhão de Melodias da Rádio Nacional, também circulava pela Cidade Nova, Praça Onze, espaços de governo e de outros intelectuais.

“Desafiando as normas da época, esses artistas vêm à tona hoje, na Lapa, em 2023, para que o público se lembre dessas histórias, conheça, ouça, veja e sinta como a arte de ontem segue trazendo inspiração para os nossos tempos, especialmente na região da Lapa, que abrigará a mostra e que tem grande importância no circuito artístico da cidade, devido à herança cultural do território, espaço pelo eles muito transitaram”, enfatiza Ana Paula.

No acervo musical da exposição, o público poderá conferir recortes de depoimentos concedidos à Rádio Nacional, especialmente de artistas como Clementina de Jesus, Elizeth Cardoso e Pixinguinha.

“A influência dos artistas e movimentos culturais negros e racializados na cultura carioca é muito forte, indissociável. Não somente no carnaval, mas na arte de uma forma geral, na comida, na arquitetura, na música… Em diversos movimentos culturais da cidade. Então, convidamos o público a refletir sobre esses encontros sonoros atemporais”, conclui a curadora.

PROGRAMAÇÃO – CICLO DE DEBATES:

“Nossas Sensações Não São Nossas” contará ainda com um ciclo de quatro debates  que  pretendem não somente examinar os temas trazidos na mostra, mas também englobar os seus possíveis desdobramentos até os dias atuais. As datas e convidados serão confirmados posteriormente.

Balanço do Carnaval:  cidade e economia – Um panorama dos espaços que o Carnaval ocupa social e economicamente, o modo como impacta e é impactado por mudanças territoriais. O bate-papo vai levantar uma discussão sobre os desdobramentos da festa ao longo dos anos e as ações que impactaram a sua história, conectando o passado e  o  presente para assim, pensar o seu futuro.

Papel dos museus e seus acervos hoje – Memória para quê e para quem? Qual o papel dos museus na contemporaneidade? Vamos debater as possibilidades de usos de acervos, a importância de sua conservação e relevância no processo de construção da formação social e cultural.

Expressões de carnaval e arte – e que modo artistas multilinguagem, como Heitor dos Prazeres e Hélio Oiticica, se relacionaram com o carnaval? A mesa propõe estabelecer um diálogo sobre as diferentes modalidades de expressões artísticas promovidas pelo carnaval que impactam e/ou são impactadas pela produção em arte contemporânea.

Carnaval entre histórias e religiões – Pretende-se apresentar os temas conduzidos pela exposição e, principalmente, a valorização do carnaval, de seus personagens e de suas crenças  na história da cultura brasileira.

FICHA TÉCNICA:

  • Obras de: André Vargas, Guga Ferreira, Jefferson Medeiros, Lucas Almeida, Mulambö e Uberê Guelé
  • Acervo: Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro
  • Curadoria: Ana Paula Rocha
  • Concepção, coordenação e produção executiva: Intrusa Cultura
  • Arquitetura e projeto expográfico: Egles Wolf
  • Identidade visual: Alessandra Santos
  • Projeto educativo: Luiza Azevedo
  • Assessoria de Imprensa: Mario Camelo
  • Fotografia: Guga Ferreira
  • Cenografia: B Larte
  • Montagem: Daniele Cristina

SERVIÇO:

Nossas Sensações Não São Nossas

  • Inauguração: 17 de março de 17h às 19h30
  • Visitação: de 20 de março a 5 de maio de 2023
  • Local: Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro
  • Endereço: Rua Visconde de Maranguape 15, Lapa
  • Horários: De segunda a sexta, das 10h às 17h
  • Grátis. Livre.
  • Mais informações em: https://www.instagram.com/mis.rio/ e https://www.instagram.com/intrusacultura

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