A escritora e dramaturga Valesca Lins está de volta com seu novo livro de contos “Rio, o Ori”, pela Artêra, selo da editora Appris. O retorno acontece um ano após conquistar o prêmio literário Maria Firmina com “Minhas conversas florescidas no Khat”, na categoria ficção, que valoriza e incentiva a produção intelectual de autores negros. A proposta é mostrar a cidade carioca fora dos cartões postais, sob ponto de vista de uma população invisível aos olhos de muita gente, mas que, ao mesmo tempo, construiu sua essência cultural tão festejada no país e no mundo. “Rio, o Ori” será lançado no próximo dia 27 de maio, às 13h, na Livraria Folha Seca, no Centro do Rio (Rua do Ouvidor, 37).
“O Rio de Janeiro é um lugar que se define pela indefinição, diversidade e psicologia das ruas. Algo que não existe em lugar algum e onde a cultura da periferia e dos povos pretos fazem ser o que ela é”, diz Valesca, nascida e criada na Zona Norte carioca. A visão das ruas atravessam as narrativas dos 12 contos, nas vozes dos personagens, em sua maioria negros, e envolvem lutas, lideranças e sentimentos de abandono que se traduzem em bairros precarizados. Memórias e o “clamor por paisagens tingidas pela coloração de quem foi oprimido”, como diz a contracapa do livro, estão em histórias como “E por falar em saudade” e “Metamorfose destes tempos” da primeira parte “A fachada das misérias”.
Os contos transmitem atmosferas de lugares diferentes, mas que se compõe numa mesma urbe, num mesmo universo urbano onde a cidade se mostra sagrada e profana, completa Valesca, que também atua há 22 anos como pedagoga na rede pública de ensino do Rio. “Quando eu falo em Ori, que significa cabeça na cultura Yorubá, digo que a cidade é onde fiz e faz minha cabeça até hoje. Pelo modo que ela constituiu a população e a mim. E que se mostra, ainda, fonte de surpresas e descobertas”, observa a autora. O livro traz também a cultura do samba e o futebol como fonte de experiência humana, presentes, por exemplo, nos contos “Panegírico a seu Iberê” e “O mais querido do Brasil”, que estão na segunda parte, “Incursões sobre a derme”.
“Rio, o Ori” tem inspirações em figuras emblemáticas como Marielle Franco, Xica Manicongo, Adrian Peper, seu Ubirany e mestre Monarco. “Marielle Franco é uma grande liderança e modificou minha vida, na forma de lutar. Xica Manicongo foi a primeira mulher trans do Brasil. Escravizada, ela chegou em Salvador no Século XVI e é um símbolo de resistência. Trago a Xica para o Rio de Janeiro, numa das narrativas. Adrian Piper é uma artista conceitual e filósofa estadunidense, que aborda o racismo e a transferência racial, também está em um dos contos. Já seu Ubirany foi cantor e compositor do maior grupo de samba do mundo: Fundo de Quintal. Criou o Repique de Mão, o qual não patenteou e perdeu um dinheirão. Faço homenagem à sua criatividade e à sua elegância. Já o mestre Monarco é baluarte da maior escola de samba do planeta: minha Portela querida que este ano fez 100 anos de existência”, festeja Valesca.