Inez Viana e Isabel Cavalcanti dirigem Ana Carbatti em espetáculo solo que reflete sobre os códigos racistas tácitos da sociedade, seus impasses, impactos e possíveis propostas de reparo.
Em uma conversa íntima com o público, uma mãe preta se pergunta: deve educar seu filho para que cresça e floresça em sua pureza ou despi-lo em tenra idade de sua inocência e prepará-lo para enfrentar uma sociedade que não o reconhece como igual? Ou ainda, é possível fazer as duas coisas?
“Vocês acham que é muito cedo para falar sobre isso com o meu filho? Vocês acham que é muito cedo para falar sobre isso com o seu filho? Ainda tem alguém aqui que ache que esse papo de perseguição do segurança é coisa da minha cabeça? Que essa coisa do porteiro mandar preto para o elevador… Vocês acham que eu estou assustada demais? Vocês acham que eu estou assustando meu filho? Que eu estou tirando a inocência dele? Vocês acham que a gente só deve falar sobre isso quando ele vier a sofrer algum tipo de discriminação? Vocês acham que estou provocando uma fera? Que ele vai se tornar um homem preto rancoroso? E que a consequência desse rancor vai ser pior do que a discriminação que venha a sofrer?”
Essas e outras tantas perguntas urgentes são o mote e a matéria-prima da peça NINGUÉM SABE MEU NOME, com texto e idealização de Ana Carbatti, também intérprete, e direção de Inez Viana e Isabel Cavalcanti, que estreia dia 16 de junho no Sesc Copacabana.
O Brasil é o primeiro país do mundo com maior população preta fora do continente africano. Por isso, promover a presença e protagonismo pretos é necessário para a construção do que pode(re)mos chamar de identidade brasileira.
NINGUÉM SABE MEU NOME propõe, sem deixar de lado o humor e a empatia, uma reflexão sobre como a sociedade ainda precisa compreender sua responsabilidade e agir para reparar sua dívida histórica com a população preta.
A peça foi concebida para dialogar com todos os públicos, e não somente com o público preto. Sem panfletarismo ou tons acusatórios, mas amorosamente, convida a todos que se entendem brancos num país mestiço a refletir sobre o que ainda não foi feito e é preciso fazer para combater o racismo estrutural.
“Nós, artistas pretos, temos o dever de usar nosso trabalho para discutir as questões da raça. ‘Ninguém sabe meu nome’ é um objeto de provocação e uma convocação.”, diz a autora e atriz, Ana Carbatti.
UM CÓDIGO TÁCITO QUE PRECISA SER DESFEITO
A personagem da peça, uma mãe preta, conta que um de seus maiores sonhos é ver o filho preto ultrapassar a marca dos 30 anos. E desfia uma lista de recomendações que sintetizam a angústia de milhões de mães no Brasil e no mundo. Aqui seguem algumas delas:
- seja educado
- não use óculos escuros
- não reaja pela emoção
- não responda
- não faça contato físico
- não faça movimentos bruscos
- não fale muito
- não fale
- lembre-se do seu objetivo: voltar pra casa em segurança
- – corte os cabelos
- – não perambule a noite
- – não use pullover com capuz
- – deixe as mãos sempre à vista
- – nunca esqueça a carteira de identidade
- – não faça nada que leve as pessoas a terem medo de você
- – não corra
- – não grite por socorro
- – não grite
- – respeite o código tácito
- – fique calmo
COM A PALAVRA, AS DIRETORAS
“Iara é mãe de um menino preto. Seu sonho, é que seu filho possa chegar aos 30 anos. Só o antirracismo conseguirá nos devolver à humanidade perdida em mais de 300 anos de escravização. Não haverá liberdade enquanto não houver igualdade. E a hora de ajudarmos a Iara a fazer com que seu filho ultrapasse os 30, é agora. Essa peça é uma das mais importantes que já fiz, em quase 40 anos de teatro. É a palavra-semente que precisa ser espalhada pelo mundo. Por isso, todos os dias, agradeço a extraordinária Ana Carbatti pelo honroso convite.”
Inez Viana, maio do terrível ano de 2022.
“Me sinto honrada por estar neste projeto. É urgente refletir e falar sobre o racismo no Brasil e sobre a violência que sofre a população preta, grande maioria no país. É fundamental repensar a história brasileira: um país fundado a partir do massacre violento de muitos, por parte de uma elite privilegiada. Nesse momento, em que vivemos um período de retrocesso político atroz, de guerra psicológica, emocional e moral, é fundamental esse debate no teatro, que é o lugar em que a nossa humanidade ainda sobrevive. E onde ainda é possível um diálogo amoroso.”
Isabel Cavalcanti
SINOPSE
Iara (Ana Carbatti) é uma mulher preta de meia idade, mãe de Menino, uma criança preta. Em uma conversa íntima com o público, questiona sua própria existência e sua função na sociedade, como mulher e mãe: educar seu filho para que cresça e floresça em sua pureza ou despi-lo, ainda em tenra idade, de sua inocência de modo a prepará-lo para o enfrentamento de uma sociedade que não o reconhece como igual. Ou, ainda, se é possível fazer as duas coisas.
FICHA TÉCNICA
- Idealização: Ana Carbatti
- Texto: Ana Carbatti
- Dramaturgia: Inez Viana e Mônica Santana
- Direção: Inez Viana e Isabel Cavalcanti
- Direção de Movimento: Cátia Costa
- Cenário: Tuca Mariana
- Figurino: Flávio Souza
- Desenho de Luz: Lara Negalara e Fernanda Mantovani
- Direção Musical: Vidal Assis
- Fotografia: Estúdio Códigos
- Vídeo/Foto: Helena Bielinsk
- Direção de Produção: Aliny Ulbricht
- Produção Executiva: Raissa Imani
- Direção de Comunicação: Daniel Barboza
- Estágio de Produção: Karen Sofia
- Coprodução: Kawaida Cultural
- Realização: Sesc Rio
- Assessoria de Imprensa: JSPontes Comunicação – João Pontes e Stella Stephany
ANA CARBATTI – atriz e autora
Formada pela CAL e pela Uni-Rio, tem trilhado nos últimos 30 anos uma carreira de sucesso no teatro, televisão e cinema. Ganhou 4 prêmios de melhor atriz por sua atuação no filme OS INQUILINOS, sob a direção de Sérgio Bianchi, com quem realizou outros dois filmes. Dentre as 20 novelas em que atuou, destacam-se A FORÇA DE UM DESEJO, JK, LAÇOS DE FAMÍLIA, LADO A LADO, AMOR À VIDA, HAJA CORAÇÃO e TEMPO DE AMAR, todas na TV Globo.
No teatro, atuou em mais de 60 produções, destacando-se em OTELO DA MANGUEIRA, A CAPITAL FEDERAL e a DIVINA COMÉDIA, respectivamente sob a direção de Daniel Herz, André Paes Leme e Regina Miranda, e TIM MAIA – O MUSICAL, sob a direção de João Fonseca, além dos espetáculos infantojuvenis MANUEL BANDEIRA: ESTRELA DA VIDA INTEIRA e HISTÓRIAS DE JILÚ. Em 2014, protagonizou o musical CLEMENTINA, CADÊ VOCÊ, dirigido por Duda Maia. Em seguida, produziu e protagonizou os espetáculos PEQUENAS TRAGÉDIAS e REDEMUNHO.
INEZ VIANA – diretora
Inez Viana é atriz há 38 anos e diretora teatral há 15. Também atua como professora e dramaturga. Tem bacharelado em Artes Cênicas e pós-graduação em direção teatral pela Faculdade CAL, RJ, 2019. Trabalhou com nomes da cena brasileira como Aderbal Freire-Filho, Sérgio Britto, Enrique Diaz, Márcio Abreu, Grace Passô, Danilo Grangheia, Cristina Moura, Denise Stutz, Pedro Kosovski, Georgette Fadel, Newton Moreno, Diogo Liberano, entre outros. Também tem passagens pelo Cinema, TV Globo e Streaming. Em 2010, fundou, junto com nove atrizes e atores, a Cia OmondÉ, que já tem 8 peças montadas, além das 9 que dirigiu fora da companhia. Seus trabalhos em atuação e direção lhe renderam vários Prêmios e indicações, como Shell e APTR.
ISABEL CAVALCANTI – diretora
Isabel Cavalcanti é diretora, atriz e autora. Indicada aos Prêmios Shell, Cesgranrio e Arte Qualidade Brasil. Publicou os livros “Eu Que Não Estou Aí Onde Estou: O Teatro de Samuel Beckett” (7Letras) e “Aquele Que Tem Mais O Que Fazer” (Poesia/ 7Letras). Mestre em Literatura Brasileira (PUC/Rio) e Mestre em Teatro (UNIRIO). Trabalha nas Artes Cênicas há 30 anos e há 3 anos como diretora de cinema. Em cinema, codirigiu o documentário “A Ultima Gravação”, sobre o ator Sergio Britto, exibido na Première do Festival do Rio 2019 e nos Festivais de NY e Miami, além de um curta-metragem de ficção, a ser lançado em 2022.
ANA CARBATTI PRODUÇÕES E ARTES
Empresa de produções artísticas e eventos culturais fundada em 2001 pela atriz e cantora Ana Carbatti, começa a atuar no mercado de produção artística quando a bailarina e coreógrafa Sueli Guerra ingressa em seu quadro de sócios, trazendo as produções de seu grupo de dança, a Companhia da Idéia, em 2007.
Desde então produziu os espetáculos de teatro-dança “Estação” em 2007, que percorreu o Brasil em temporada e participou de festivais, “Jangada de Pedra” em 2010, sobre a obra homônima de José Saramago, “Pequenas Peças” em 2011, sobre a obra de Clarice Lispector, no Teatro do Jockey, e “Será”, intervenções públicas de dança teatro em praças públicas e trens do Rio de Janeiro, em 2012. O ano de 2013 marca a iniciativa da empresa no campo das artes cênicas, idealizando e produzindo o espetáculo “Pequenas Tragédias”, contemplado pela Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro, realizando temporada de sucesso na Casa de Cultura Laura Alvim, nos meses de abril e maio, assim como em São Paulo, em março de 2014, através do subsídio federal da Caixa Cultural. Em 2017, em parceira com a Cia. Falácia produções, a empresa idealizou e produziu o espetáculo “Redemunho”, cuja estreia ocorreu no Teatro da Casa de Cultura Laura Alvim, em março.